QUALIDADE DE VIDA: DIREITOS HUMANOS FUNDAMENTAIS NOS
OBJETIVOS DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL – ODS (ONU, 2015-2030).
Maria da Glória Colucci*
Dando continuidade aos Objetivos
de Desenvolvimento do Milênio (ODM-2000-2015), a Organização das Nações Unidas
lançou os ODS – Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, como proposta
desafiadora de combate às situações ainda persistentes, de extrema miséria,
fome, doenças crônicas, endêmicas ou não, somadas às carências de ordem
socioeconômicas, que representam graves embaraços ao desenvolvimento
sustentável e à qualidade de vida, obstaculizando o exercício dos direitos
humanos fundamentais.
Poder-se-á dizer que a “sadia
qualidade de vida” representa o elo entre o desenvolvimento sustentável e a
dignidade da pessoa, ambos princípios constitucionais, insculpidos, respectivamente,
nos arts. 225, 5º e 1º, III da Lei Maior, igualmente presentes no Documento
Final da Rio+20 – fundamentos dos direitos individuais e coletivos.
Ao se promover a análise do
Documento Final da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento
Sustentável (Rio+20), realizada de 20 a 22 de junho de 2012, e a tutela dos
direitos humanos fundamentais, se torna imprescindível destacar alguns aspectos
a serem objeto de reflexão, tais como:
a) a
importância dos direitos humanos fundamentais, sob o prisma da sadia qualidade
de vida, com base no texto constitucional;
b) a
necessidade de abordagem do desenvolvimento sustentável e suas interlocuções
com a redução das desigualdades sociais, inclusão e promoção da pessoa, com
base nos ODS (2015-2030);e, também,
c) o
minucioso exame dos avanços doutrinários, legais e jurisprudenciais em defesa
da qualidade de vida e dos direitos humanos fundamentais, sobretudo, à vida,
saúde, educação, trabalho, lazer, moradia, dentre outros, presentes na
Constituição e no Documento Final da Conferência, são determinantes à
compreensão da qualidade de vida.
Quanto
aos Estados signatários do Documento Final, firmado em junho de 2012, no Rio de
Janeiro, com a participação da sociedade civil, renovaram o compromisso
anteriormente assumido (2000, ONU), de promover “[...] um futuro econômico,
social e ambientalmente sustentável para o nosso planeta e as gerações
presentes e futuras”.[1]
Sem
dúvida, o foco determinante de todas as iniciativas governamentais, dos Chefes
de Estado e demais representantes oficiais presentes à Conferência Rio+20, foi
a preservação da vida humana na multiplicidade de aspectos que comporta, desde
a gestação até à morte. Desta sorte, o Documento dá prioridade às populações
mais vulneráveis do planeta, cuja situação de exposição contínua às
adversidades naturais, políticas, étnicas, religiosas, e de outra ordem, tem-se
intensificado crescentemente em virtude do abandono e exclusão social que
sofrem:
Reconhecemos que as pessoas
constituem o centro do desenvolvimento sustentável e a este respeito nos
esforçamos em alcançar um mundo que seja justo, equitativo e inclusivo, e nos
comprometemos a trabalhar conjuntamente para promover o crescimento econômico
sustentável e inclusivo, o desenvolvimento social e a proteção do meio
ambiente, o que redundará em benefício de todos. (tradução livre).[2]
As várias áreas do saber humano, quer se apresentem como
ciência, técnica, arte e suas particularizações, contribuem para o estudo da
“qualidade de vida”, cujas interfaces são evidentes, sobretudo diante do
inevitável conflito entre crescimento (quantitativo) e desenvolvimento
(qualitativo). Visto que nem sempre se verifica a necessária convergência entre
ambos, as desigualdades têm-se acentuado, apesar dos esforços e investimentos
realizados:
Preocupa-nos profundamente o fato de
que uma em cada cinco pessoas deste planeta, vale dizer, mais de 1000 milhões
de pessoas, continuem vivendo em extrema pobreza, e que uma em cada sete, ou
seja 14%, está mal nutrida, tanto que certos problemas de saúde pública, como
as pandemias e epidemias, continuam a ser uma ameaça sempre presente.[3]
Sob o foco da sustentabilidade social novas perspectivas se
oferecem, uma vez que a sociedade pós-moderna, em decorrência do consumismo
exarcebado, exige que as empresas estejam alinhadas com a utilização de
tecnologias não poluentes e energias renováveis, em prol da “sadia qualidade de
vida” (art. 225, Constituição de 1988).
Tomando-se como base os
fundamentos constitucionais para análise da “qualidade de vida”, não se poderá
restringir sua interpretação e aplicação ao meio ambiente, em suas diversas
significações, mas se deve ampliar sua compreensão à pesquisa dos direitos
individuais e coletivos.
Considerando-se
a diversidade de questionamentos que a análise dos direitos humanos
fundamentais envolve, algumas indagações podem ser oferecidas, tais como:
a) Por
que saúde, educação, cidadania, igualdade de gênero, automação,
sustentabilidade e moradia possuem como vértices comuns a vulnerabilidade e
dignidade da pessoa humana (Art. 1º, III, CF)?
b) Qual
o papel das políticas públicas no Brasil para a promoção dos direitos humanos
fundamentais, nas áreas de sustentabilidade e qualidade de vida de populações
carentes?
c) Como
a educação e o trabalho podem contribuir para minimizar os graves problemas
sociais de saúde, drogas, criminalidade e exclusão no Brasil?
d) De
que modo mudanças climáticas, políticas e econômicas podem ser contornadas, ou
superadas, mediante o compromisso firmado entre os Chefes de Estado, de Governo
e representantes de alto nível, signatários do Documento Final da Rio+20
(junho, 2012)?
Conforme assinala Demétrius Coelho Souza, após minuciosa
pesquisa bibliográfica sobre a qualidade de vida e suas relações com os
direitos fundamentais, deve-se considerar que:
[...] os temas alusivos ao meio
ambiente, qualidade de vida, bem-estar, dignidade da pessoa humana e valores
fundamentais encontram-se intimamentes associados, não se podendo falar em
qualidade de vida sem qualidade ambiental[...].[4]
Prosseguindo, o mesmo autor
destaca a necessidade do olhar constitucional da “qualidade de vida” ser
multidisciplinar, envolvendo a sustentabilidade urbana e a totalidade da pessoa
humana (cidadão), diretamente afetado pelo meio ambiente em que mora, trabalha,
descansa – “vive”:
Conclui-se, como já alertado, que os
temas cidade, bem-estar, qualidade de vida, meio ambiente e planejamento
encontram-se umbilicalmente associados. Não se pode deixar de mencionar, ainda,
que o planejamento urbano deve ser realizado com o máximo de técnica e
comprometimento possível, razão pela qual se encontra associado ao planejamento
ambiental.[5]
Apesar
da amplitude dos temas, a análise deve se embasar, principalmente, nos
Documentos Internacionais mais recentes, na Constituição da República em vigor,
na doutrina e jurisprudência focadas nos direitos humanos fundamentais, além de
outras fontes.
Por último, a
“qualidade de vida” é não só direito, como princípio, diretriz conceitual ou
fonte para efetivação de práticas sustentáveis as mais diversas, devendo
resultar sua observância em humanização das cidades, da saúde, do trabalho, da
educação, da moradia etc, em cumprimento constitucional da solidariedade,
refletida nos objetivos da República, presentes no art. 3º, incisos I a IV, da
Carta de 1988.[6]
REFERÊNCIAS
[1]
ONU, Documento Final da
Conferência Rio+20 – “O Futuro que Queremos”(I.1), disponível em www.onu.org.br
2 Idem, I.6.
3 Idem, II.B.21
4 SOUZA, Demétrius Coelho. O meio ambiente das cidades. São Paulo: Atlas,
2010,p.51.
5 Idem, p.59.
6
BRASIL, Constituição da República Federativa do. Promulgada em 05 de outubro de
1988. Disponível em http://www.planalto.gov.br
*
Mestre em Direito
Público pela UFPR. Especialista em Filosofia do Direito pela
PUCPR. Professora titular de Teoria Geral do Direito do UNICURITIBA. Professora
Emérita do Centro Universitário Curitiba, conforme título conferido pela
Instituição em 21/04/2010. Orientadora do Grupo de Pesquisas em Biodireito e
Bioética – Jus Vitae, do UNICURITIBA,
desde 2001. Professora adjunta IV, aposentada, da UFPR. Membro do IAP –
Instituto dos Advogados do Paraná. Membro da Sociedade Brasileira de Bioética –
Brasília. Membro do CONPEDI – Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em
Direito. Membro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
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