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08/05/2020

Agenda 2030: CIDADES SUSTENTÁVEIS E HUMANIZADAS

Maria da Glória Colucci [1]

          Não obstante, em sua dimensão conceitual apareça no singular, o Texto Constitucional disciplina “as funções sociais da cidade” (art. 182, caput), revelando que são diversas, a partir do Plano Diretor, considerado o “instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana” (§ 1º, do art. 182, CF). [2]
          À guisa de aproximação conceitual, a “função social” da cidade pressupõe equilíbrio entre a estrutura (aspecto estático do modelo urbanístico) e a função (a dinâmica ou modus operandi daquele modelo).
          O interesse público na urbanização prevalece sobre o privado, mas não ao ponto de descaracterizar a “face urbana”, tornando-a uma “caricatura” do que já foi em sua evolução como espaço compartilhado por muitas gerações; como acontece em aplaudidas “intervenções urbanas”, que retiram todo o passado de uma cidade, dando-lhe um traçado moderno, porém dissociado de sua história…
          Dentre os aspectos a serem levados em conta, surge a destinação dos bens particulares, nem sempre condizente com o planejamento urbano. A segurança e a saúde de seus habitantes, como acontece com imóveis vazios, onde se escondem desocupados, ficam comprometidas pelo abandono de seus proprietários, tornando-se “criadouros” de mosquitos e animais pestilentos.
          Deste modo, a segurança, que é um direito de todos, mas ao mesmo tempo responsabilidade de cada um, fica seriamente comprometida com a presença de terrenos baldios ou prédios abandonados em logradouros públicos (art. 144, CF).[3]
          José Afonso da Silva afirma que a propriedade urbana deve respeitar o “complexo sistema da disciplina urbanística”, subordinando-se ao interesse coletivo, predominante no planejamento urbano.[4]
          A mobilidade parece ser um dos mais desafiantes problemas urbanos, sobretudo se se considerar que integra o “bem-estar de seus habitantes”, porque a facilidade de acesso corresponde a um dos direitos fundamentais, qual seja, o de locomoção, por qualquer meio lícito admitido pela Lei (art. 5º, XV, CF).[5]
          Harmonizar os interesses individuais e coletivos não quer significar tão somente um belo traçado urbano, mas implica em humanizar as condições de vida, preservar as tradições e a destinação natural dos espaços urbanos.
          Deste modo, a função social das cidades pressupõe a presença de, no mínimo, três requisitos: mobilidade, urbanização preservadora e segurança, dentre outros.
          Por outro lado, os adensamentos populacionais nas grandes cidades, em elevações, beiras de estradas de ferro, rodovias e prédios desocupados, estão se avolumando como um problema ameaçador, no mínimo, em relação à segurança e à moradia.
          Casas feitas algumas de alvenaria, construídas em barrancos, em despenhadeiros, na direção de pedras, que podem se desprender a qualquer momento, representam uma pressão diária, como ameaças à vida e patrimônio de seus moradores.
          No entanto, os adensamentos populacionais urbanos parecem aumentar a olhos vistos de autoridades, cidadãos e turistas, como se fossem permitidos, apesar de serem construções irregulares.
          Recentes desabamentos no Rio de Janeiro colocaram diante de todos prédios construídos sem as mínimas condições de segurança, sob o ponto de vista da Engenharia e da Natureza, de forma clandestina.[6]
A Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas tem dentre seus Objetivos a proposta de tornar as cidades mais inclusivas, seguras, resilientes e sustentáveis (ODS 11); destacando-se, em contrapartida, a necessidade de promover o crescimento econômico equilibrado dos seus moradores (ODS 8). [7]
          Embora situada em ODS separados, a ideia matriz comum é dar condições dignas de vida, saúde e dignidade a todos os habitantes das cidades.
          Apesar das políticas públicas em mobilidade urbana, moradia e segurança ainda serem insuficientes face à demanda contínua dos centros urbanos e suas periferias, a Lei Maior confere aos Municípios a competência quanto à ordenação do “pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantia do bem-estar de seus habitantes” (art. 182, caput, CF). [8]
          Por outro prisma, os adensamentos urbanos representam um crescente desafio às autoridades públicas, em razão dos frequentes conflitos gerados pela falta de moradia e as invasões de prédios públicos e particulares desabitados.         
          As “milícias” dominam a vida, a liberdade e o bem-estar dos cidadãos destes locais densamente habitados; ocupando o espaço do Estado que, pela inércia e falta de fiscalização, não garante a mobilidade e a segurança dos seus moradores.



[1] Advogada. Especialista em Filosofia do Direito (PUC-Pr). Mestre em Direito Público (UFPR). Professora aposentada da UFPr. Professora titular de Teoria do Direito (UNICURITIBA). Orientadora do Grupo de Pesquisas em Biodireito e Bioética – Jus Vitae. Membro do Instituto dos Advogados do Paraná (IAP). Membro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Membro da Comissão do Pacto Global (OAB-Pr). Membro da Associação Brasileira de Mulheres de Carreira Jurídica (ABMCJ-Pr). Membro do Movimento Nacional ODS (ONU, Pr). Membro da Academia Virtual Internacional de Poesia, Arte e Filosofia- AVIPAF. Membro do Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos do UNICURITIBA. Escritora e poetisa, com vários prêmios em textos jurídicos e poéticos.
[2] BRASIL. Constituição da República Federativa do. 1988; disponível em www.planato.gov.br
[3] BRASIL. Constituição da República Federativa do. 1988; disponível em www.planato.gov.br
[4] SILVA, José Afonso da. Direito urbanístico brasileiro. 5 ed. São Paulo: Malheiros Ed; 2008, p.79.
[5] BRASIL. Constituição da República Federativa do. 1988; disponível em www.planato.gov.br
[6] BRASIL. Desabamento no Rio: o que se sabe sobre o desastre na Muzema, zona oeste carioca; disponível em https://www.bbc.com/portuguese/geral-47899484
[7] ONU. Transformando Nosso Mundo: a Agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável; disponível em https://nacoesunidas.org/pos2015/agenda2030/
[8] BRASIL. Constituição da República Federativa do. 1988; disponível em www.planato.gov.br

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25/04/2020

Agenda 2030: GLOBALIZAÇÃO, GLOBALISMO E DESIGUALDADES ECONÔMICAS E SOCIAIS NO SÉCULO XXI (ODS 10)







Maria da Glória Colucci[1]





          A expansão econômica da Europa ocidental, nos séculos XV a XVIII, se deu por vários fatores, dentre os quais, a exploração ultramarina, e a intensificação do comércio pela descoberta de antigas invenções, como a pólvora e a bússola, segundo Marvin Perry.[2]

          Para além dos anseios expansionistas dos conquistadores, houve a divulgação do saber acumulado pela criação da imprensa (Guttenberg – 1450) e a formação dos Estados Nacionais, aliados ao surgimento dos ideais libertários, culminando com a Revolução Francesa (1789).[3]

          O cenário político, econômico e social e a efervecência daí resultante abriram as portas para o que se considera a primeira fase da “globalização”, entendida como um período em que o comércio internacional parecia não ter fronteiras, apesar dos riscos de naufrágios, muito frequentes, por sinal.

          O período foi marcado pela presença de usos e costumes comerciais, principalmente nas cidades livres onde feiras de artigos oriundos da Ásia, como especiarias e seda, representavam forte atrativo aos ricos habitantes de cidades como Gênova, Pisa e Milão.

          Os mecenas, ricos comerciantes da época, estimulavam as artes, sobretudo a pintura, com a finalidade de parecem ser “cultos” e prósperos perante os nobres e frequentadores das Cortes.[4]

          A diversidade de costumes, oriundos das diversas regiões do mundo conhecido à época, e o intercâmbio comercial forneceram os elementos necessários ao surgimento de um novo tipo de pessoas, os habitantes das cidades. Aglomerados, empobrecidos e discriminados, oriundos do campo, em sua maioria estrangeiros ou não, formaram nas periferias das cidades em surgimento verdadeiros guetos.

Destarte, a marginalização que se espraiou pela Europa e a gritante segmentação social dai resultante podem ser apontadas como as remotas raízes das desigualdades sociais e econômicas que permanecem até hoje?

Independente da resposta, observa-se que a miséria, a pobreza e a prosperidade ainda convivem nas grandes cidades, com maior ou menor visibilidade, ao redor do mundo. Cidades globalizadas enfrentam graves problemas de segurança e urbanização.

Quanto ao “globalismo”, corresponde ao fenômeno de grandes organizações, nas mais distintas atividades, que se espalham em redes pelo mundo, dominando áreas, como da comunicação, a exemplo do Google, Apple, etc. No que se refere ao alcance destas redes e como influenciam e controlam a vida das pessoas, ditando costumes e gerando novas necessidades, é desnecessário ressaltar que “universalisam” o modo de ser desta ou daquela região do mundo, por exemplo, “ocidentalizando” modos de vestir, relacionar-se ou mesmo “vícios”.[5]

À globalização, ou comércio sem fronteiras físicas, culturais ou de outra natureza, somou-se o globalismo, espécie de domínio de grupos de informação, culturais ou mesmo religiosos, sobre grande parte do mundo pós-moderno.

Barreiras técnicas são necessárias para estabelecer limites à atuação destas organizações, a par de fixar padrões de ordem ética e social, em defesa das pessoas, do meio ambiente e do desenvolvimento sustentável, como ressalta Luiz Olavo Baptista, ao analisar os reflexos da criação da Organização Mundial do Comércio (1995):



A partir da existência da OMC, passou a existir uma espécie de garimpo dentro das normas da organização. Foram criadas regras para contemplar questões que não estavam na previsão original, como desenvolvimento sustentável, proteção do meio ambiente e garantia dos direitos humanos.[6]



        Procurando o enfrentamento das desigualdades sociais no trabalho, em decorrência da evidente hipossuficiência dos operários, agricultores e empregados, em face das poderosas organizações internacionais do comércio, verificou-se, em palavras de Luiz Olavo Baptista, que:



[...] durante as negociações sobre as regras da OMC, houve uma resistência muito grande, inexplicável, por exemplo, em relação à cláusula social, que impunha padrões trabalhistas para assegurar condições mínimas de trabalho.[7]



          Os obstáculos ao reconhecimento dos direitos fundamentais continuam presentes e atualíssimos, não apenas no trabalho, mas no acesso aos bens e serviços, que representam não apenas satisfação de necessidades individuais e coletivas, mas status, vale dizer, aceitação, reconhecimento e “aplausos” dos demais, como sintetiza Zygmunt Bauman:



Como você já sabe o quanto isso depende de seu acesso aos bens de consumo, é óbvio que, para seguir suas inclinações morais, você precisa traduzir o postulado de “ser alguém” na capacidade de garantir que terá todos os bens, na quantidade e qualidade certas, de que precisa para fazer face à sua responsabilidade pelos outros.[8]



          As desigualdades têm fortes raízes na ampliação do campo de comércio e consumo, com a globalização, de um lado, e com o globalismo, de outro.

          Com a Carta do Milênio (ONU, 2000), procurou-se construir “Objetivos” (ODM), que representassem de forma universal o anseio comum de desenvolvimento dos povos (“Oito Jeitos de Mudar o Mundo”).

          O advento dos ODS (2015-2030), com a Agenda Global 2030 da ONU, promoveu em 17 Objetivos uma síntese universal dos direitos humanos fundamentais, presentes na grande maioria das legislações ocidentais, que devem ser reconhecidos e implementados no mundo.[9]

          Em especial, os ODS – Objetivos do Desenvolvimento Sustentável – ressaltam como núcleos de suas metas e estratégias a promoção da dignidade da pessoa humana e seus atributos essenciais, representados pelos direitos sociais (art. 6º da Constituição de 1988).[10]

          No ODS 10 propõe a Agenda Global 2030, expressamente, que deve ser um compromisso comum dos povos signatários: “Reduzir a desigualdade entre os países e dentro deles”.[11]

A redução das desigualdades econômicas e sociais é um desafio comum a todos os povos, cuja superação somente será alcançada mediante a promoção de sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável (ODS 16), contando com a cooperação internacional.[12]



Advogada. Especialista em Filosofia do Direito (PUC-Pr). Mestre em Direito Público (UFPR). Professora aposentada da UFPr. Professora titular de Teoria do Direito (UNICURITIBA). Orientadora do Grupo de Pesquisas em Biodireito e Bioética (desde 2001) – JUS VITAE – no UNICURITIBA. Membro do Instituto dos Advogados do Paraná (IAP). Membro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Membro da Comissão do Pacto Global (OAB-Pr). Membro da Associação Brasileira de Mulheres de Carreira Jurídica (ABMCJ-Pr). Membro do Movimento Nacional ODS (ONU, Pr). Membro da Academia Virtual Internacional de Poesia, Arte e Filosofia- AVIPAF. Membro do Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos do UNICURITIBA. Escritora e poetisa, com vários prêmios em textos jurídicos e poéticos.
[2]PERRY. Marvin. Civilização ocidental: uma história concisa. Trad. Waltensir Dutra, Silvana Vieira. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 267.
[3] Ibidem.  
[4] PERRY. Marvin. Op. cit., p. 268.
[5] PAESANI, Liliana Minardi. Direito e internet: liberdade de informação, privacidade e responsabilidade civil. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2013, p. 23-25.
[6] BAPTISTA, Luiz Olavo. In: O Brasil e a globalização: pensadores do direito internacional. Organizado por Mauricio Almeida Prado, Renata Duarte de Santana. São Paulo: Ed. de Cultura, 2013, p. 19.
[7] Ibidem.
[8] BAUMAN, Zygmunt. Danos colaterais: desigualdades sociais numa era global. Rio de Janeiro: Zahar, 2013, p. 102.
[9] ONU. Transformando Nosso Mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Disponível em: https://sustainabledevelopment.un.org/?menu=1300
[10] BRASIL. Constituição da República Federativa do. 1988. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm
[11] ONU. Transformando Nosso Mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Disponível em: https://sustainabledevelopment.un.org/?menu=1300
[12]ONU. Transformando Nosso Mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Disponível em: https://sustainabledevelopment.un.org/?menu=1300


[1] Advogada. Especialista em Filosofia do Direito (PUC-Pr). Mestre em Direito Público (UFPR). Professora aposentada da UFPr. Professora titular de Teoria do Direito (UNICURITIBA). Orientadora do Grupo de Pesquisas em Biodireito e Bioética (desde 2001) – JUS VITAE – no UNICURITIBA. Membro do Instituto dos Advogados do Paraná (IAP). Membro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Membro da Comissão do Pacto Global (OAB-Pr). Membro da Associação Brasileira de Mulheres de Carreira Jurídica (ABMCJ-Pr). Membro do Movimento Nacional ODS (ONU, Pr). Membro da Academia Virtual Internacional de Poesia, Arte e Filosofia- AVIPAF. Membro do Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos do UNICURITIBA. Escritora e poetisa, com vários prêmios em textos jurídicos e poéticos.
[2] ONU. Transformando Nosso Mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Disponível em www.nacoesunidas.org
[3] BRASIL. Constituição da República Federativa do. 1988. Disponível em www.planalto.gov.br
[4] COELHO, Luiz Fernando. Saudade do futuro. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2001, p.39-40.
[5] VOLPI NETO, Ângelo. Comércio eletrônico – direito e segurança. Curitiba: Juruá, 2001, p.21.
[6]PARANÁ, Jornal Gazeta do Povo. Dia Internacional da Internet Segura Disponível em www.gazetadopovo.com.br\blogs\educacao
[7] FREITAS, Marcelo Araújo. O processo judicial eletrônico: implicações na atuação do oficial de justiça. Curitiba: JM. Livraria Jurídica, 2011, p. 45.
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08/04/2020

Agenda 2030: INOVAÇÃO E TECNOLOGIA: DESAFIOS À IGUALDADE SOCIAL (ONU, ODS 9)





Maria da Glória Colucci[1]



Dentre os dezessete Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, integrantes da Agenda Global 2030, o ODS 9 enfatiza a necessidade da “industrialização inclusiva e sustentável”, além de fomentar a inovação; visando “construir infraestrutura resiliente”, no enfrentamento de complexos desafios sociais.[2]

Vive-se um novo momento na comunicação, uma transição que começou pelos anos 90 e prossegue, ainda, apesar de passada mais de uma década do início do presente século; com contornos que surpreendem a cada dia. O domínio da técnica permanece como uma das marcas desta transição para a pós-modernidade que, de tão evoluída, deixou de ser, apenas, aplicação da ciência, para tornar-se Tecnologia. Somada ao materialismo utilitarista e à supremacia do individualismo narcisista, a sociedade globalizada desembocou no consumismo que destrói os recursos naturais, sem controle.

Neste contexto, quando o ODS 9 se propõe a implementar a inovação; a Agenda Global visa, acima de tudo, combater o subdesenvolvimento, construindo uma sociedade economicamente forte, igualitária e focada na promoção do bem-estar coletivo e individual. Ao serem oportunizadas condições de acesso aos direitos sociais, presentes no art. 6º, da Constituição brasileira de 1988, todos os cidadãos são beneficiados pelos avanços tecnológicos, na saúde, educação, trabalho segurança, habitação, etc.[3]

Conforme análise de Luiz Fernando Coelho, a inovação e a tecnologia andam lado a lado, e seus reflexos sociais e econômicos vão muito além do que se pode pensar:



[...] se acrescentou ao domínio da tecnologia o domínio da informação. Mas não se trata somente da introdução de novas tecnologias relacionadas com o desenvolvimento dos computadores, mas de um processo muito mais profundo que decorre do extraordinário progresso científico, em especial, os desenvolvimentos em microfísica, biologia molecular e cosmologia, e sua aplicação tecnológica nos mais diversos setores da ciência e da técnica. [4]

Em virtude das mudanças ocorridas no século XXI, na comunicação, novos espaços foram concebidos, muito além dos tradicionalmente conhecidos, cuja nomenclatura foi acrescida do denominado “espaço virtual”, no qual os limites éticos, morais e mesmo até jurídicos, “parecem” ter desaparecido... As “invasões” de diversas naturezas, a exemplo da privacidade, intimidade, matrimonialidade, capacidade contributiva e aquisitiva etc.., são frequentes, aumentando o nível de exposição dos internautas aos perigos dos procedimentos levianos dos hackers.

Em destaque, infelizmente, o fato desconcertante representado pelas falsas ideias que vicejam e são veiculadas no ambiente virtual, nem sempre se dando a atenção exigida, em razão do desconhecimento dos limites legais que existem, quanto às manifestações coletivas ou individuais, de cunho social, científico, religioso ou de outra ordem, e os possíveis danos causados ao público.

Também, notícias dão conta, com frequência, do cyberbulling, praticado contra crianças, adolescentes e jovens, cujos efeitos nefastos são de todos conhecidos. Os constrangimentos de ordem moral, pela exposição do corpo, dos diálogos e da intimidade, são desastrosos (nudes)

As investidas contra a honra, liberdade e cidadania passam, na maioria das vezes, despercebidas, por uma diversidade de causas, dentre as principais, a desinformação quanto aos riscos morais e patrimoniais e a suposta “liberdade” irrestrita, sem efetiva conscientização, dos seus malefícios:





A explosão da Internet determinou uma transformação qualitativa e quantitativa das informações e a possibilidade de comunicação imediata criou um novo domínio social do indivíduo: o poder informático. A Internet introduziu um outro elemento inovador: tornou a sociedade efetivamente transparente, possibilitando a qualquer pessoa o acesso a uma quantidade máxima de informações em relação a qualquer aspecto da vida social. [5]



Em decorrência da informalidade, da transparência e da celeridade dos meios eletrônicos, rapidamente, a adesão do grande público se verificou, sem que a sociedade estivesse preparada para os impactos causados aos desavisados, dentre os quais, crianças e adolescentes.

Novas situações foram criadas, uma vez que se intensificou o comércio eletrônico, com todos os desafios à seriedade e respeito aos direitos do consumidor.

Muitas vezes, o consumidor online compra bens que não oferecem as características divulgadas (em utilidade, cor, tamanho etc.), ou não coincidem quanto às condições de pagamento, preços, entrega, garantias e outras informações importantes para o uso do bem. É comum que ao reclamar, o consumidor não consiga localizar o espaço físico ou mesmo o responsável pelo site que disponibilizou o produto ou o serviço.

Acresce que campanhas diversas têm sido encetadas para a segurança dos meios eletrônicos no País e no mundo, procurando-se conscientizar adultos comprometidos com os valores da cultura brasileira para a necessidade de vigilância em relação aos jovens, adolescentes e crianças expostos aos perigos da Internet. Neste sentido, foi instituído o Dia Internacional da Internet Segura – 11 de fevereiro.[6]

Diversas instituições estão comprometidas no intuito comum de fortalecer e ampliar a segurança no uso das tecnologias, despertando no cidadão brasileiro o dever de colaborar (denunciando ou sugerindo medidas) para a defesa de crianças e adolescentes face ao mau uso dos meios de informação, sobretudo, os crimes pela web.

O uso benéfico da Internet é, todavia, de indiscutível valor, como ocorre com a assinatura eletrônica, de acordo com a Lei 11.419/2006, que se apresenta como digital e cadastral, conferindo veracidade ao documento, além de assegurar a autenticidade da assinatura.[7]

Neste caminho, ressalte-se a evolução e o crescimento das ciências, em geral, mediante a divulgação de novas descobertas, com o favorecimento (pelo conhecimento) às conquistas científicas, sobretudo, em saúde. Destaque-se, porém, os perigos do charlatanismo que acompanha a divulgação de fármacos “milagrosos”, de cirurgias plásticas; remédios emagrecedores etc., explorando a credibilidade dos usuários.



[1] Advogada. Especialista em Filosofia do Direito (PUC-Pr). Mestre em Direito Público (UFPR). Professora aposentada da UFPr. Professora titular de Teoria do Direito (UNICURITIBA). Orientadora do Grupo de Pesquisas em Biodireito e Bioética (desde 2001) – JUS VITAE – no UNICURITIBA. Membro do Instituto dos Advogados do Paraná (IAP). Membro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Membro da Comissão do Pacto Global (OAB-Pr). Membro da Associação Brasileira de Mulheres de Carreira Jurídica (ABMCJ-Pr). Membro do Movimento Nacional ODS (ONU, Pr). Membro da Academia Virtual Internacional de Poesia, Arte e Filosofia- AVIPAF. Membro do Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos do UNICURITIBA. Escritora e poetisa, com vários prêmios em textos jurídicos e poéticos.
[2] ONU. Transformando Nosso Mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Disponível em www.nacoesunidas.org
[3] BRASIL. Constituição da República Federativa do. 1988. Disponível em www.planalto.gov.br
[4] COELHO, Luiz Fernando. Saudade do futuro. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2001, p.39-40.
[5] VOLPI NETO, Ângelo. Comércio eletrônico – direito e segurança. Curitiba: Juruá, 2001, p.21.
[6]PARANÁ, Jornal Gazeta do Povo. Dia Internacional da Internet Segura Disponível em www.gazetadopovo.com.br\blogs\educacao
[7] FREITAS, Marcelo Araújo. O processo judicial eletrônico: implicações na atuação do oficial de justiça. Curitiba: JM. Livraria Jurídica, 2011, p. 45.
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26/11/2019

Agenda 2030: TRABALHO DECENTE COMO DIREITO SOCIAL (ODS 8)





Maria da Glória Colucci[1]


          O trabalho esteve associado nos primórdios das sociedades humanas ao sofrimento, dor e pesada carga a ser suportada para sobrevivência individual e do grupo. As atividades braçais predominavam, devido à necessidade de cultivo do solo e trato com os animais, envolvendo, apenas, a força física para caçar e transportar os alimentos produzidos.[2]
          Com o tempo, todavia, superadas as etapas mais longínquas do esforço individual no trabalho e chegando-se à Idade Média, foram surgindo novas formas de labor, com a divisão das tarefas entre “companheiros” e “aprendizes”, sob o comando dos “mestres”, que remuneravam apenas os “companheiros”.
          No entanto, apesar da evolução na organização das atividades, os “mestres”, proprietários das oficinas, podiam impor castigos corporais aos “aprendizes” cujos pais pagavam taxas elevadas para que aprendessem o ofício ou profissão.[3]
          Com a Revolução Industrial (XVII) e o aparecimento de máquinas a vapor, o trabalho tornou-se de um lado mais produtivo pela substituição do labor manual pela máquina, mas, de outro ponto de vista, cruel, pelas condições desumanas e insalubres. Assim, os trabalhadores ficavam expostos ao excessivo calor, incêndios, explosões, intoxicações por gases etc, aceitando-se o trabalho de crianças e jornadas de mais de 18 horas.
          Na verdade, a história do trabalho é marcada, ainda, pela exploração, indignidade e desrespeito ao ser humano, haja vista, a denominada “escravidão moderna” (ao redor do mundo).[4]
          Com as Declarações de Direitos, a exemplo da francesa (1789) e americana (1776), foram sendo abolidas práticas mais cruéis, mas ainda persistentes em muitas regiões do mundo.
          Novos horizontes se abriram ao combate ao trabalho escravo, com a criação da Organização Internacional do Trabalho (1919), “que iria incumbir-se de proteger as relações entre empregados e empregadores no âmbito internacional, expedindo convenções e recomendações nesse sentido.[5]
          No Brasil, com a Constituição de 1934 e mais tarde, com a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em 1943, as relações contratuais de trabalho receberam fôlego, dando-se à atividade laboral mais valorização.[6]
          Com a Constituição de 1988, nos arts. 7º a 11, o trabalho adquiriu status de direito social, cuja natureza prestacional (dever do Estado) impõe limites intransponíveis à dignidade da pessoa humana.[7]
          Ao ver de José Cláudio Monteiro de Brito Filho, o trabalho decente requer condições adequadas ao exercício desta importante atividade humana, podendo ser assim conceituado:

Trabalho decente, então, é um conjunto mínimo de direitos do trabalhador que corresponde: ao direito ao trabalho; à liberdade de trabalho; à igualdade no trabalho; ao trabalho com condições justas, incluindo a remuneração, e que preservem sua saúde e segurança; a proibição do trabalho infantil; à liberdade sindical; e à proteção contra os riscos sociais.[8]

          Assim, o trabalho decente deve ser entendido como a atividade humana que cumpre com as formalidades legais para seu exercício, respeitados os direitos e princípios constitucionalmente garantidos e internacionalmente adotados, em Documentos da OIT – Organização Internacional do Trabalho.[9]
          O trabalho evoluiu de uma concepção escravizante, humilhante e até mesmo degradante da pessoa do trabalhador, para ser transformado, em decorrência de novos valores, em autorealização, em instrumento de ascensão social, pelo status alcançado, pelo empoderamento decorrente do enriquecimento ou do reconhecimento profissional.
          Pode-se afirmar que o “trabalho decente” tem por finalidade principal propiciar ao empregado o bem-estar individual (satisfação, felicidade), ao mesmo tempo que lhe permite atender às suas necessidades e de sua família com dignidade (art. 7º, IV, CF).[10]
          Por tantos motivos, além dos citados, foi que a Agenda 2030 (ONU) incluiu dentre seus Objetivos (ODS), o de nº. 8: “Promover o crescimento econômico sustentado, inclusivo e sustentável, emprego pleno e produtivo e trabalho decente para todos”.[11]


[1] Advogada. Especialista em Filosofia do Direito (PUC-Pr). Mestre em Direito Público (UFPR). Professora aposentada da UFPr. Professora titular de Teoria do Direito (UNICURITIBA). Orientadora do Grupo de Pesquisas em Biodireito e Bioética – Jus Vitae. Membro do Instituto dos Advogados do Paraná (IAP). Membro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Membro da Comissão do Pacto Global (OAB-Pr). Membro da Associação Brasileira de Mulheres de Carreira Jurídica (ABMCJ-Pr). Membro do Movimento Nacional ODS (ONU, Pr). Membro da Academia Virtual Internacional de Poesia, Arte e Filosofia- AVIPAF. Membro do Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos do UNICURITIBA. Escritora e poetisa, com vários prêmios em textos jurídicos e poéticos.
[2] MARCONI, Marina de Andrade./Zélia Maria Neves Presotto. Antropologia: uma introdução. 6º ed. São Paulo: Atlas, 2005, p.118-120.
[3] MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 14 ed. São Paulo: Atlas, 2001, p.34.
[4] Escravidão moderna atinge mais de 40 milhões no mundo. Disponível em www.noticias.uol.com.br
[5] MARTINS, Sérgio Pinto. Op.cit; p.38.
[6] BRASIL. Consolidação das Leis do Trabalho. Decreto-Lei n.5452, de 1º de maio de 1943. Disponível em www.planalto.gov.br
[7] BRASIL. Constituição da República Federativa do. 1988. Disponível em www.planalto.gov.br
[8] BRITO FILHO, José Claudio Monteiro de. Trabalho decente: análise jurídica da exploração do trabalho: trabalho escravo e outras formas de trabalho indigno. 4 ed. São Paulo: Ltr, 2016, p.56.
[9] OIT. Organização Internacional do Trabalho. Disponível em www.nacoesunidas.org
[10] BRASIL. Constituição da República Federativa do. 1988. Disponível em www.planalto.gov.br
[11] ONU. Transformando Nosso Mundo: Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Disponível em www.nacoesunidas.org
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