Por Vitória Farias
Podemos dizer
que o século XX representa o nascimento social da mulher, pois foi nessa época
que conquistaram o direito ao voto, esse de extrema importância, uma vez que
representa o exercício da cidadania. Nesse contexto se passa o filme “As
sufragistas”, lançado em 2015 e dirigido pela britânica Sarah Gavron. Conta com
a participação de grandes atrizes como Carey Mulligan, Helena Bunham e Meryl
Steep, que interpretam mulheres revolucionárias que viveram durante a primeira
onda feminista da Inglaterra.
O filme apresenta
uma grande crítica ao governo, machista e opressor, desse período histórico. A
mulher era inferiorizada e a sociedade excessivamente sexista. Ela era vista
como uma propriedade que pertencia e obedecia ao homem. O casamento era a
passagem da responsabilidade de cuidar, proteger e, principalmente, chefiar do
pai para o marido. As mulheres não tinham independência sobre suas vidas e suas
escolhas. Todo o seu salário era entregue ao seu companheiro. Ela não tinha
liberdade e muito menos autonomia.
A sociedade como um
todo, era submetida a péssimas condições de trabalho: locais fechados, sem
equipamentos de segurança e com emissão diária de gases e produtos tóxicos. Mas
isso se ampliava ainda mais em relação às mulheres. Suas cargas horárias de
trabalho eram extensas e cansativas. Muitas sofriam abuso sexual, verbal e psicológico
de homens com cargos superiores. O filme expõe, através da protagonista Maud
Watts, que muitas vezes as mulheres grávidas trabalhavam exaustivamente,
inclusive na etapa final da gestação e pouco após terem os bebês. Maud afirma
que nasceu na fabrica em que trabalha. Começou seu oficio, durante meio
período, aos sete e aos doze anos assumiu a mesma carga horaria de todas as
outras. O filme representa uma sociedade afastada do humanismo e deixa a pensar
quantas outras mulheres não morreram por não aguentar essa carga excessiva.
A política era
exercida exclusivamente por homens. E aí surge uma provocação ao assistir ao
filme: Os homens poderiam representar as mulheres? Durante o longa, é possível
compreender que homens não exprimem as vontades e as necessidades de uma
mulher, pois eles não sabem o que elas vivem e como a discriminação as afeta.
Afirmo isso, pois, se as representassem, elas ganhariam o mesmo salario que
seus maridos, teriam a mesma carga horária de trabalho, autonomia sobre sua
vida e seu dinheiro. Se assim fosse, dariam a ela o direito ao
ensino e a vida política. Durante uma discussão no parlamento o filme nos traz
os argumentos que eram utilizados para impedir o voto feminino. Eles alegavam
que elas seriam de um sexo frágil e não teriam equilíbrio hormonal para exercer
tal atividade. Declaram também, que elas não precisam desse direito, pois seus
maridos já elegiam por elas, porque saberiam quais seriam suas exigências.
Existem vários
pontos importantes a serem analisados no filme, e um deles é a atitude rebelde
que essas mulheres adquiriram como forma de chamar a atenção para as suas
reinvindicações. As sufragistas apelaram para uma campanha nacional de
desobediência civil. Existem várias cenas no filme que demonstram isso:
mulheres quebrando vitrines e explodindo lugares públicos gritando pelo direito
ao voto, escrevendo os próprios jornais, já que a imprensa não era verdadeira
sobre suas pautas. Esse aspecto traz um pensamento valorativo do voto. Muitas
vezes ele parece ser natural. Não paramos para pensar o quanto lutamos pra isso
e quantas mulheres morreram para que hoje todas nós possamos exercer nossos
direitos e deveres como cidadãs.
Outro ponto
marcante ao assisti-lo, é a mudança extraordinária que ocorre na vida de
Maud após ser inserida na causa sufragista. Maud, uma mulher comum para a
época que trabalhava, era casada e tinha um filho, uma mulher que achava normal
as condições de trabalho que ela, e muitas outras, se submetiam (ela chega
inclusive a afirmar que os patrões eram bons), a forma como inferiorizavam as
mulheres e os abusos que sofriam. Era comum Maud se sentir inferior e sempre
obedecer à lei sem ao menos confronta-la. Aos poucos, com a ajuda de outras
mulheres que defendiam a causa, Maud foi começando a entender os problemas
sociais e políticos que enfrentava e porque o voto poderia mudar isso. O
momento que ela afirma, com orgulho, ser uma sufragista é emocionante. A
protagonista percebe que a lei não está e nunca esteve ao lado de mulheres e
vai lutar para que ela e outras possam mudar isso, como ela mesma deixa claro
no filme: “O senhor me disse que ninguém ouve garotas como eu. Eu não posso
mais viver com isso. Toda minha vida eu fui respeitosa, fazendo o que os homens
me pediam. Agora eu sei. Não valho nada mais, nada menos que você. A Sra.
Pankhurst disse uma vez que se é certo para os homens lutar por sua liberdade,
então é certo para as mulheres lutarem pelas delas.” A partir desse momento
nasce uma nova mulher. Uma Maud totalmente engajada no movimento sufragista e
que se importa com a situação da mulher na sociedade.
O filme se encerra
com um momento trágico, no qual Emily Davidson (Natalie Press), que até então
não tinha um destaque na história, toma uma atitude extremamente importante
para a luta do direito ao voto feminino. A ação de Emily trouxe a atenção e a
visibilidade que o movimento precisava, mas teve um custo alto.
Após muita luta e a
prisão de várias mulheres, elas conquistam o direito ao voto em 1918, para
aquelas que tinham mais de 30 anos. Em 1928 esse direito se iguala ao dos
homens.
Trazendo essa luta
para o Brasil, observamos que em 1932, na Era Vargas, as mulheres obtiveram a
garantia ao voto. Porém nessa época, o Código Civil vigente (1916) mantinha
elementos profundos da subordinação da mulher e da visão dela como propriedade
masculina. Somente em 1988, com a nova Constituição, que foi introduzido o
principio da igualdade entre homens e mulheres perante a lei.
É importante que
tenhamos uma reflexão sobre essa conquista: as sufragistas deram o “ponta pé
inicial” para toda essa luta. Hoje todas nós, mulheres, podemos votar e
escolher quem melhor nos representa e como cidadãs temos o dever de continuar
lutando por uma maior inclusão e representatividade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário