Maria da Glória Colucci[1]
A
expansão econômica da Europa ocidental, nos séculos XV a XVIII, se deu por
vários fatores, dentre os quais, a exploração ultramarina, e a intensificação
do comércio pela descoberta de antigas invenções, como a pólvora e a bússola,
segundo Marvin Perry.[2]
Para
além dos anseios expansionistas dos conquistadores, houve a divulgação do saber
acumulado pela criação da imprensa (Guttenberg – 1450) e a formação dos Estados
Nacionais, aliados ao surgimento dos ideais libertários, culminando com a
Revolução Francesa (1789).[3]
O
cenário político, econômico e social e a efervecência daí resultante abriram as
portas para o que se considera a primeira fase da “globalização”, entendida
como um período em que o comércio internacional parecia não ter fronteiras,
apesar dos riscos de naufrágios, muito frequentes, por sinal.
O
período foi marcado pela presença de usos e costumes comerciais, principalmente
nas cidades livres onde feiras de artigos oriundos da Ásia, como especiarias e
seda, representavam forte atrativo aos ricos habitantes de cidades como Gênova,
Pisa e Milão.
Os
mecenas, ricos comerciantes da época, estimulavam as artes, sobretudo a
pintura, com a finalidade de parecem ser “cultos” e prósperos perante os nobres
e frequentadores das Cortes.[4]
A
diversidade de costumes, oriundos das diversas regiões do mundo conhecido à
época, e o intercâmbio comercial forneceram os elementos necessários ao
surgimento de um novo tipo de pessoas, os habitantes das cidades. Aglomerados,
empobrecidos e discriminados, oriundos do campo, em sua maioria estrangeiros ou
não, formaram nas periferias das cidades em surgimento verdadeiros guetos.
Destarte, a marginalização que
se espraiou pela Europa e a gritante segmentação social dai resultante podem
ser apontadas como as remotas raízes das desigualdades sociais e econômicas que
permanecem até hoje?
Independente da resposta,
observa-se que a miséria, a pobreza e a prosperidade ainda convivem nas grandes
cidades, com maior ou menor visibilidade, ao redor do mundo. Cidades
globalizadas enfrentam graves problemas de segurança e urbanização.
Quanto ao “globalismo”,
corresponde ao fenômeno de grandes organizações, nas mais distintas atividades,
que se espalham em redes pelo mundo, dominando áreas, como da comunicação, a
exemplo do Google, Apple, etc. No que se refere ao alcance destas redes e como
influenciam e controlam a vida das pessoas, ditando costumes e gerando novas
necessidades, é desnecessário ressaltar que “universalisam” o modo de ser desta
ou daquela região do mundo, por exemplo, “ocidentalizando” modos de vestir,
relacionar-se ou mesmo “vícios”.[5]
À globalização, ou comércio
sem fronteiras físicas, culturais ou de outra natureza, somou-se o globalismo,
espécie de domínio de grupos de informação, culturais ou mesmo religiosos,
sobre grande parte do mundo pós-moderno.
Barreiras técnicas são
necessárias para estabelecer limites à atuação destas organizações, a par de
fixar padrões de ordem ética e social, em defesa das pessoas, do meio ambiente
e do desenvolvimento sustentável, como ressalta Luiz Olavo Baptista, ao
analisar os reflexos da criação da Organização Mundial do Comércio (1995):
A
partir da existência da OMC, passou a existir uma espécie de garimpo dentro das
normas da organização. Foram criadas regras para contemplar questões que não
estavam na previsão original, como desenvolvimento sustentável, proteção do
meio ambiente e garantia dos direitos humanos.[6]
Procurando o enfrentamento das desigualdades sociais no
trabalho, em decorrência da evidente hipossuficiência dos operários,
agricultores e empregados, em face das poderosas organizações internacionais do
comércio, verificou-se, em palavras de Luiz Olavo Baptista, que:
[...]
durante as negociações sobre as regras da OMC, houve uma resistência muito
grande, inexplicável, por exemplo, em relação à cláusula social, que impunha
padrões trabalhistas para assegurar condições mínimas de trabalho.[7]
Os
obstáculos ao reconhecimento dos direitos fundamentais continuam presentes e
atualíssimos, não apenas no trabalho, mas no acesso aos bens e serviços, que
representam não apenas satisfação de necessidades individuais e coletivas, mas status, vale dizer, aceitação,
reconhecimento e “aplausos” dos demais, como sintetiza Zygmunt Bauman:
Como
você já sabe o quanto isso depende de seu acesso aos bens de consumo, é óbvio
que, para seguir suas inclinações morais, você precisa traduzir o postulado de
“ser alguém” na capacidade de garantir que terá todos os bens, na quantidade e
qualidade certas, de que precisa para fazer face à sua responsabilidade pelos
outros.[8]
As
desigualdades têm fortes raízes na ampliação do campo de comércio e consumo,
com a globalização, de um lado, e com o globalismo, de outro.
Com
a Carta do Milênio (ONU, 2000), procurou-se construir “Objetivos” (ODM), que
representassem de forma universal o anseio comum de desenvolvimento dos povos
(“Oito Jeitos de Mudar o Mundo”).
O
advento dos ODS (2015-2030), com a Agenda Global 2030 da ONU, promoveu em 17
Objetivos uma síntese universal dos direitos humanos fundamentais, presentes na
grande maioria das legislações ocidentais, que devem ser reconhecidos e implementados
no mundo.[9]
Em
especial, os ODS – Objetivos do Desenvolvimento Sustentável – ressaltam como
núcleos de suas metas e estratégias a promoção da dignidade da pessoa humana e
seus atributos essenciais, representados pelos direitos sociais (art. 6º da
Constituição de 1988).[10]
No
ODS 10 propõe a Agenda Global 2030, expressamente, que deve ser um compromisso
comum dos povos signatários: “Reduzir a desigualdade entre os países e dentro
deles”.[11]
A redução das desigualdades
econômicas e sociais é um desafio comum a todos os povos, cuja superação
somente será alcançada mediante a promoção de sociedades pacíficas e inclusivas
para o desenvolvimento sustentável (ODS 16), contando com a cooperação
internacional.[12]
Advogada. Especialista em Filosofia do Direito
(PUC-Pr). Mestre em Direito Público (UFPR). Professora aposentada da UFPr.
Professora titular de Teoria do Direito (UNICURITIBA). Orientadora do Grupo de
Pesquisas em Biodireito e Bioética (desde 2001) – JUS VITAE – no UNICURITIBA. Membro do Instituto dos Advogados do
Paraná (IAP). Membro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência
(SBPC). Membro da Comissão do Pacto Global (OAB-Pr). Membro da Associação
Brasileira de Mulheres de Carreira Jurídica (ABMCJ-Pr). Membro do Movimento
Nacional ODS (ONU, Pr). Membro da Academia Virtual Internacional de Poesia,
Arte e Filosofia- AVIPAF. Membro do Comitê de Ética em Pesquisa em Seres
Humanos do UNICURITIBA. Escritora e poetisa, com vários prêmios em textos
jurídicos e poéticos.
[2]PERRY.
Marvin. Civilização ocidental: uma história concisa. Trad. Waltensir Dutra,
Silvana Vieira. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 267.
[5]
PAESANI, Liliana Minardi. Direito e
internet: liberdade de informação, privacidade e responsabilidade civil. 6.
ed. São Paulo: Atlas, 2013, p. 23-25.
[6]
BAPTISTA, Luiz Olavo. In: O Brasil e a
globalização: pensadores do direito internacional. Organizado por Mauricio
Almeida Prado, Renata Duarte de Santana. São Paulo: Ed. de Cultura, 2013, p.
19.
[8]
BAUMAN, Zygmunt. Danos colaterais:
desigualdades sociais numa era global. Rio de Janeiro: Zahar, 2013, p. 102.
[9] ONU.
Transformando Nosso Mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.
Disponível em: https://sustainabledevelopment.un.org/?menu=1300
[10]
BRASIL. Constituição da República Federativa do. 1988. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm
[11] ONU.
Transformando Nosso Mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.
Disponível em: https://sustainabledevelopment.un.org/?menu=1300
[12]ONU. Transformando Nosso Mundo: a Agenda
2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Disponível em: https://sustainabledevelopment.un.org/?menu=1300
[1]
Advogada. Especialista em Filosofia do Direito (PUC-Pr). Mestre em Direito
Público (UFPR). Professora aposentada da UFPr. Professora titular de Teoria do
Direito (UNICURITIBA). Orientadora do Grupo de Pesquisas em Biodireito e
Bioética (desde 2001) – JUS VITAE –
no UNICURITIBA. Membro do Instituto dos Advogados do Paraná (IAP). Membro da
Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Membro da Comissão do
Pacto Global (OAB-Pr). Membro da Associação Brasileira de Mulheres de Carreira
Jurídica (ABMCJ-Pr). Membro do Movimento Nacional ODS (ONU, Pr). Membro da
Academia Virtual Internacional de Poesia, Arte e Filosofia- AVIPAF. Membro do
Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos do UNICURITIBA. Escritora e
poetisa, com vários prêmios em textos jurídicos e poéticos.
[2] ONU. Transformando Nosso
Mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Disponível em
www.nacoesunidas.org
[3] BRASIL. Constituição da
República Federativa do. 1988. Disponível em www.planalto.gov.br
[4] COELHO,
Luiz Fernando. Saudade do futuro. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2001, p.39-40.
[5] VOLPI
NETO, Ângelo. Comércio eletrônico – direito
e segurança. Curitiba: Juruá, 2001, p.21.
[6]PARANÁ,
Jornal Gazeta do Povo. Dia Internacional da Internet Segura Disponível
em www.gazetadopovo.com.br\blogs\educacao
[7] FREITAS,
Marcelo Araújo. O processo judicial eletrônico:
implicações na atuação do oficial de justiça. Curitiba: JM. Livraria
Jurídica, 2011, p. 45.
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