24/06/2019

Agenda 2030: POBREZA EXTREMA E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL (ODS 1)


Maria da Glória Colucci[i]

          Uma das evidências mais gritantes das desigualdades sociais no século XXI é, sem dúvida, a extrema pobreza.
          Ao descrever um dos períodos mais conflituosos da sociedade burguesa dos séculos XVI e XVII e o adensamento das vilas e cidades, Leo Huberman estabeleceu uma estranha sequência, espécie de escalada dos seres humanos empobrecidos da época: “... Homem pobre, mendigo, ladrão:”[ii]
          Como se pode notar, a triste evolução do trajeto econômico e social dos indivíduos à margem do acesso às riquezas não difere, em nada, do que ocorre nas cidades globalizadas da atualidade, com a presença de moradores de rua, catadores de material reciclável, pedintes etc.
          Nas sociedades globalizadas, o adensamento urbano, somado à escassez de moradia, e ao desemprego se incumbem de gerar os segmentos sociais marginalizados que se conhece como “pobres”. O intenso comércio internacional e a exclusão do acesso aos bens e serviços ampliam o fenômeno da pobreza para além dos limites territoriais nacionais; de sorte a se tornar um dos ODS – Objetivos de Desenvolvimento Sustentável - , identificado na Agenda Global 2030 (ONU), como sendo urgente necessidade dos Chefes de Estado e Autoridades presentes à sede das Nações Unidas, em Nova York, de 25 a 27 de setembro de 2015, “Acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares”.[iii]
          À vulnerabilidade econômica, social e moral, somam-se a vulnerabilidade profissional e intelectual que impedem o acesso às fontes de recursos representadas pelo trabalho decente (ODS 8); em razão da falta de profissionalização dos indivíduos em extrema pobreza e de investimentos em educação para o mercado de trabalho.
          Por outro lado, a extrema pobreza aparece quantificada na Agenda 2030 como sendo aquela situação em que a pessoa vive com menos de US$1,25 por dia, o que se torna aviltante em uma época em que o consumismo, o desperdício e o descarte de bens se tornaram algo corriqueiro.[iv] Correlatamente, a criminalidade se intensificou, sem que o Poder Público tenha alcançado controle da segurança pública no País:

Mas a pobreza, com a humilhação e a falta de perspectiva, é uma dedicada companheira de viagem; ela persiste não apenas em países cuja pobreza, miséria e desnutrição são conhecidas desde tempos imemoriais, mas está tornando a visitar terras das quais parecia ter sido expulsa e banida de uma vez por todas, sem direito de retorno.[v]

          De algum modo, a pobreza extrema estimula a prática de crimes contra o patrimônio, além de outros tantos “males sociais”, conforme descreve Bauman; e se entende abrangendo “homicídios, mortalidade infantil, níveis crescentes de problemas mentais e emocionais [...]”[vi]
          Quanto ao Direito Econômico Internacional, Celso Lafer afirma que os reflexos da fase posterior à Segunda Guerra Mundial foram muitos, procurando-se superar o “protecionismo, as desvalorizações cambiais competitivas, as grandes crises financeiras” e, acrescente-se, a pobreza, a miséria e a exploração do trabalho.[vii]
          O aumento de impostos, somado à má distribuição das riquezas, a pobreza em todas as suas faces, acrescida das doenças e do desemprego, afetam, significativamente, a qualidade de vida do grupo social e, não apenas, dos denominados “pobres”. A propósito da qualidade de vida sua aferição se dá pelo IDH – Índice de Desenvolvimento Humano, cujos elementos de composição priorizam o bem-estar social e individual de um País, e sua percepção não se reduz, apenas, ao crescimento econômico – avaliado pelo PIB – Produto Interno Bruto.
          Dentre os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil (art. 3º, III), previstos na vigente Constituição (1988), encontra-se o de “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais”.[viii]
          No Brasil, historicamente, podem ser lembrados, o Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza, conforme dispõem a Emenda Constitucional n. 31, de 14/12/2000; a Emenda Constitucional n.67, de 22/12/2010 e a Lei Complementar n.111, de 6/7/2001; por fim, o Decreto n.7.492, de 2/6/2011, instituiu o Plano Brasil Sem Miséria.[ix]
          A Agenda Global da Organização das Nações Unidas, ao prever o combate à pobreza e à fome, se propôs até 2030 a “reduzir pelo menos à metade a proporção de homens, mulheres e crianças, de todas as idades, que vivem na pobreza, em todas as suas dimensões, de acordo com as definições nacionais” (1.2).[x]





REFERÊNCIAS


[i] Advogada. Especialista em Filosofia do Direito (PUC-Pr). Mestre em Direito Público (UFPR). Professora aposentada da UFPr. Professora titular de Teoria do Direito (UNICURITIBA). Membro do Instituto dos Advogados do Paraná (IAP). Membro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Membro da Comissão do Pacto Global (OAB-Pr). Membro da Associação Brasileira de Mulheres de Carreira Jurídica (ABMCJ-Pr). Membro do Movimento Nacional ODS (ONU, Pr). Membro da Academia Virtual Internacional de Poesia, Arte e Filosofia- AVIPAF. Membro do Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos do UNICURITIBA. Escritora e poetisa, com vários prêmios em textos jurídicos e poéticos.

[ii] HUBERMAN, Leo. História da riqueza do homem. 9º ed. Trad. Waltensir Dutra. Rio de Janeiro: Zahar Ed, 1973, p.106.

[iii] ONU. Transformando Nosso Mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Disponível em www.sustainbledevelopmentun.org

[iv] ONU. Transformando Nosso Mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Disponível em www.sustainbledevelopmentun.org

[v] BAUMAN, Zygmunt. Danos colaterais: desigualdades sociais numa era global. Trad. Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Zahar, 2013, p.52.

[vi] Idem, p.53.

[vii] LAFER, Celso. In o Brasil e a globalização: pensadores do direito internacinal. Org. por Maurício Almeida Prado, Renata Duarte de Santana. São Paulo: Ed. Cultura, 2013, p.45.

[viii] BRASIL. Constituição da República Federativa do. 1988. Disponível em www.planalto.gov.br

[ix] BRASIL. Decreto n.7.492, de 2 de junho de 2011. Institui o Plano Brasil Sem Miséria. Disponível em www.brasil.gov.br

[x] ONU. Transformando Nosso Mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Disponível em www.sustainbledevelopmentun.org

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