21/05/2021

Animais como sujeitos de direito: eles podem figurar como o autor dos pleitos judiciais?

 




Por Bruna Mortari¹ e Profª Lucimar de Paula²


Desde muito pequenos somos criados com ideias e pensamentos oriundos do antropocentrismo, que considera o animal humano como ser superior a outras espécies, colocado em posição de supremacia em relação ao demais animais e da natureza como um todo, que, por sua vez, é considerada somente como uma fornecedora de recursos de valor intrínseco.

Objetiva-se estabelecer a importância de se respeitar os direitos dos animais não humanos, elevando-os a sujeitos de direito e obrigando o Estado, nas tomadas de decisões, considerar os direitos desses animais.

Dessa forma, há a necessidade de se adotar medidas que ajudem a criar essa condição de equilíbrio entre os animais humanos e os animais não humanos, e para isso, destaca-se que a Constituição do Brasil já reconhece desde outubro de 1988 que os animais não humanos têm valor em si próprio e por isso são destinatários de direitos fundamentais constitucionais.

Todos os animais possuem direito a ter uma existência digna por força do artigo 225, §1º, inciso VII, parte final da Constituição da República Federativa do Brasil, abaixo transcrito, que confere os deveres ao Estado e à coletividade de coibir toda forma de crueldade animal e de proteger a fauna e a flora de toda prática que coloquem em risco suas espécies, ao mesmo tempo que estabelece aos animais o direito de não serem submetidos às práticas cruéis.

 

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

 

1.º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público:

...

 

VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.

 

Porém, pode-se notar que mesmo com a devida proteção constitucional, ainda há muita resistência nos órgãos do legislativo para a regulamentação da norma constitucional mencionada anteriormente.

A visão antropocêntrica, ainda é muito evidente, pois é ela que sustenta a coisificação dos animais, classificados como meros bens móveis, tendo-os como objeto de entretenimento, transporte, experimentação, esportes, vestuário etc.

A busca pelo equilíbrio entre as relações humanas e não humanas hoje se dá pela necessidade de subsistência da própria espécie humana. Cada animal na natureza tem uma função ecológica, de fundamental importância para a manutenção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, que oferece ao ser humano a esperada qualidade de vida.

O desrespeito às leis da natureza vem acarretando a extinção de diversas espécies de animais, desertificação de áreas antes cultiváveis, as mudanças climáticas que vem obrigando a migração de pessoas e animais em busca de um lugar mais seguro e próspero para se viver.

Como visto anteriormente, o pensamento que ainda predomina na sociedade é que o meio ambiente é uma fonte de satisfação das necessidades humanas, onde não existe racionalidade na utilização dos recursos naturais e, quando se pensa em sustentabilidade, ela se dá enquanto associada ao bem-estar humano.

Desta forma, a Constituição do Brasil ao estabelecer que os animais são destinatários de direitos fundamentais constitucionais, obrigou as diversas leis, tais como o código civil, o código de processo civil, o código de defesa do consumidor, e tantas outras, adequarem-se a previsão constitucional sob pena de ser revogada por estar em conflito com a norma maior.

Se os animais têm direitos, isso significa que podem buscar a tutela desses direitos perante o Poder Judiciário, já que a Constituição do Brasil determina no art. 5º, inciso XXXV, não poder a lei excluir da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.

Não obstante, a previsão constitucional, no Congresso Nacional existem projetos de leis tramitando com o objetivo de encerrar a discussão sobre a natureza jurídica dos animais e a capacidade de ser parte em processos judiciais.

No dia 07/08/2019, foi aprovado com emendas pelo Senado, o projeto de lei nº 6.054/2019 (n.º anterior 6.799/2013), que acrescenta o parágrafo único, ao artigo 82, do Código civil, dispondo sobre a natureza jurídica dos animais domésticos e silvestres, e dá outras providências.

Como o Senado Federal emendou o projeto de lei, já aprovado pela Câmara dos Deputados, o projeto retornou à Comissão do Meio Ambiente da Câmara dos Deputados para deliberação.

Está tramitando também na Câmara dos Deputados o projeto de lei n.º 145/2021 que disciplina a capacidade de ser parte dos animais não-humanos em processos judiciais e inclui o inciso XII ao art. 75 da Lei n.º 13.105, de 16 de março de 2015 – Código de Processo Civil, para determinar quem poderá representar os animais em juízo.

A proposta tem o objetivo de permitir que os animais possam ser, individualmente, representados pelo ministério Público, pela Defensoria Pública, por associações de proteção dos animais ou por quem detenha sua tutela.

Argumenta o autor do referido projeto de lei, o deputado Eduardo Costa (PTB-PA), que:

 

"Se até uma pessoa jurídica, que muitas vezes não passa de uma folha de papel arquivada nos registros de uma Junta Comercial, possui capacidade para estar em juízo, inclusive para ser indenizada por danos morais, parece fora de propósito negar essa possibilidade para que animais”. Fonte: Agência Câmara de Notícias

 

Acrescenta o deputado que a presença de animais no polo ativo de processos judiciais, reivindicando seus direitos, já é uma questão discutida em diversos países, e que no Brasil o debate está sendo cada vez maior e reconhecido pela doutrina.

Atualmente, o projeto de lei aguarda o parecer do Relator, o Deputado Ricardo Izar (PP-SP) na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS).

Analisando as novas possibilidades que estão sendo discutidas como projetos de lei atualmente, é possível concluir que o caminho para a inclusão dos animais como seres destinatários de direitos e capazes de reivindicá-los judicialmente está próximo, em que pese tal previsão esteja positivada na Constituição da República Federativa do Brasil desde 05 de outubro de 1988.

 



 

¹ Graduanda em Direito e integrante do GP em Direito Animal do UNICURITIBA

² Coordenadora do GP em Direito Animal do UNICURITIBA

 

REFERÊNCIAS


https://www.camara.leg.br/propostas-legislativas/2268821 

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm 

https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=node0lruwan0a8cpe1h9n5bjoxq0an1308246.node0?codteor=1198509&filename=PL+6054/2019+%28N%C2%BA+Anterior:+PL+6799/2013%29 

https://paulossalmeidaadv.jusbrasil.com.br/artigos/151203513/a-visao-ecocentrica-do-meio-ambiente-no-mundo-juridico#:~:text=O%20avan%C3%A7o%20do%20pensamento%20ecoc%C3%AAntrico,72.  


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