Imagine viver em uma cidade onde a lei parece não mais
existir. Uma cidade dominada pela falta de água, na qual as pessoas precisam
umas das outras em todos os momentos para sobreviver. Bacurau retrata o futuro
(mas não tão distante assim) de uma cidade fictícia de mesmo nome, localizada
no interior de Pernambuco.
Com uma história bastante brasileira, o filme faz
metaforicamente várias críticas à condição de miserabilidade vivida por milhares
de pessoas no Nordeste e, ao mesmo tempo, exige uma atenção especial de seu
espectador para ‘pegar’ referências que são bastante nossas. Graciliano Ramos,
Canudos, Antônio Conselheiro, Lampião...Todos são elementos que de forma não
óbvia ajudam a enriquecer a aura da obra.
Temos, por exemplo, o político que só aparece em tempos de
eleição, com donativos e uma clara busca pela compra de votos. Temos a
prostituição evidenciada como única forma de sobrevivência para algumas
pessoas. Temos o posto de saúde que sofre para ter um abastecimento mínimo de
medicamentos e vacinas.
Partindo daí, a trama do filme passa a tratar de uma série
de assassinatos que passam a ocorrer na pequena cidade. Com um único carro de
polícia (que é uma lata velha que nem pode sair do lugar), os moradores passam
a tentar descobrir por si só o que está acontecendo. O filme é tenso,
misterioso e muitas vezes agoniante, o que nesse caso é ótimo.
Mesmo com nomes importantes do cinema, como Sônia Braga,
Bacurau não tem um protagonista definido, o que faz a cidade como um todo
ganhar ainda mais importância. É uma aposta no seu povo e na força do coletivo.
Bacurau é uma aula e um filme necessário para o Brasil
atual. Questões como xenofobia são bastante presentes, seja aquela de sulistas
com nordestinos, seja de estrangeiros com brasileiros.
Dirigido por Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, o
filme é um faroeste que remete a, por exemplo, Quentin Tarantino, mas sem
deixar de ser brasileiro em momento algum. Confesso que também lembrei da série
britânica Black Mirror ao assistir, com vários momentos de “explodir a cabeça”
sobre o que está acontecendo.
O tom político e as várias camadas sociais tratadas são seu
maior atrativo para entender, mesmo que de forma exagerada, o Brasil atual. A
violência exacerbada e o uso de armas também são elementos que merecem atenção
ao acompanhar o desenrolar da história.
Premiado em Cannes, Bacurau já ganhou a atenção do mundo,
isso sem deixar de ser Brasil em momento algum.
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