28/07/2019

Me indica um livro: Como as democracias morrem









            A Ciência Política é uma das matérias basilares à formação dos juristas, que possui o Estado como objeto de seu estudo, e traça íntimo diálogo com o Direito Constitucional. E, neste ponto, que iniciaremos a nossa sugestão de leitura para o início deste segundo semestre letivo. Como as Democracias Morrem[1] foi um livro escrito por dois professores/pesquisadores de Ciência Política de Harvard, Steven Levitsky e Daniel Ziblatt. O primeiro possui o enfoque de sua pesquisa na América Latina, e Ziblatt na Europa do século XIX até os dias atuais.
            A obra teve sua primeira edição publicada no Brasil em ano eleitoral, em 2018, e é considerada um best-seller devido sua linguagem acessível, qualidade e recorte da pesquisa, sendo o tema extremamente relevante devido os contextos subversivos à democracia que ressurgem de forma sutil na política, em escala global. Em nove capítulos, nos é apresentado pelos professores Levitsky e Ziblatt o que o The New York Times classificou de guia lúcido e essencial sobre como as democracias podem entrar em colapso seja o lugar que for.
            O livro foi escrito com a intenção de se responder a pergunta: “democracias tradicionais entram em colapso?”. E, tal questão, advém do fato da democracia norte americana ser uma das mais consolidadas e referenciadas democracias do mundo, mas que, atualmente tem gerado uma crescente incerteza a respeito da segurança de seu sistema democrático de direito devido ao seu cenário político, desde a eleição de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos. Para isso, Levitsky e Ziblatt comparam a situação política atual norte americana com uma análise histórica de contextos de regimes totalitários ocorridos no mundo. Neste ponto, o olhar sobre tais conjunturas ocorridas na América Latina, bem como o contexto e análise sobre a democracia nos Estados Unidos é enriquecedor. Servindo-nos como um alerta, principalmente à nós brasileiros, em relação ao nosso cenário político atual que tem buscado, por parte de nossos representantes eleitos, um espelhamento e sujeição equivocada aos posicionamentos e estratégias do presidente norte-americano (em termos de políticas sociais, ambientais e militares).
            Os autores demonstram, através de suas pesquisas, como a ruína da democracia pode se dar de diversas formas. O que antigamente se configurava numa morte abrupta e trágica — como ocorrido no Chile, em que a morte da democracia foi marcada com a morte do presidente eleito Allende, pelas forças armadas chilenas — pode também ocorrer de maneira gradual, sutil e legal, através de líderes eleitos, os chamados outsiders políticos.

“O retrocesso democrático hoje começa nas urnas.”[2]

            Além do diagnóstico minucioso de como processos antidemocráticos se instauram no poder através do próprio sistema democrático afim de dissolvê-lo, há alguns pontos importantes da obra que gostaríamos de ressaltar. O primeiro, é o papel do Poder Legislativo e do Poder Judiciário que, nesses cenários de subversão da democracia, atuam como aliados do Poder Executivo, aprovando e aceitando seus atos. Mantendo, através de uma legitimidade legal própria da segurança jurídica, o que Levitsky e Ziblatt denominaram de um “verniz de democracia” enquanto o sistema, em sua essência é corroído.
Em segundo, a maneira como aspirantes a autocratas justificam medidas antidemocráticas através de situações de crise como instabilidade econômica, perigo à segurança nacional, ou mesmo desastres naturais. Desta forma, o verniz se mantém, conseguindo a tolerância e, por vezes, o apoio da população em tais decisões.
Outro ponto, refere-se ao papel fundamental de partidos já estabelecidos em salvaguardar a democracia, distanciando-se, isolando e derrotando forças extremistas que pretendem ascender ao poder. Para isso, é essencial que tais partidos tenham clareza sobre o perfil, posicionamento e discurso de seus candidatos, bem como, tenham a defesa do sistema democrático e do bem do país acima de qualquer divergência política e ideológica.
            A obra Como as Democracias Morrem é densa em seu conteúdo, e merece um olhar atento dos acadêmicos de Direito. É um livro fundamental pois, visando responder às incertezas políticas de nosso tempo, perpassa os fundadores do presidencialismo norte americano — desde o início preocupados com salvaguarda da democracia —, os caminhos trilhados pelo autoritarismo na América Latina e na Europa, e o papel das Constituições que, de acordo aos autores, possuem ao menos quatro defensores: as instituições críticas, os partidos políticos, os cidadãos organizados e as normas democráticas.

Boa leitura!


[1] LEVITSKY, Steven; ZIBLATT, Daniel. Como as Democracias Morrem. Tradução: Renato Aguiar. 1 ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2018.
[2] LEVITSKY; ZIBLATT, 2018, p. 16.


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