DE
PAULA, LUCIMAR
(Professora do UNICURITIBA e
coordenadora do Grupo de Pesquisa)
DE
MIRANDA, MARIANA VITORINO
(Acadêmica de Direito e integrante do Grupo de Pesquisa)
É com a Constituição de 1988 que o
Direito Animal surge no Brasil como um ramo autônomo do Direito. Não obstante,
o Decreto n.º 24.645, de 10 de julho de 1934, editado por Getúlio Vargas,
enquanto vigia a primeira Constituição Republicana, de 1891, enumerava os atos
de maus tratos e as penalidades previstas. O constituinte de 1988 ao incumbir
ao Poder Público o dever de proteger os animais contra a crueldade, acaba por
definir o objeto de estudo do Direito Animal, isto é, os direitos fundamentais
dos animais, bem como o princípio informador do novo ramo do direito, o
princípio da dignidade animal.
No plano internacional, a
Declaração Universal dos Direitos dos Animais de 1978 faz conhecer os direitos
animais. Essa declaração não possui força normativa, porém serve de parâmetro para
o legislador e julgador na tomada de decisões. Importante destacar os direitos
animais previstos nesse documento:
“Art. 1º - Todos os animais nascem iguais perante a vida e têm os mesmos
direitos à existência.
Art. 2º - 1. Todo o animal tem o direito a ser respeitado. 2. O homem,
como espécie animal, não pode exterminar os outros animais ou explorá-los
violando esse direito; tem o dever de pôr os seus conhecimentos ao serviço dos
animais. 3. Todo o animal tem o direito à atenção, aos cuidados e à proteção do
homem.
Art. 3º - 1. Nenhum animal será submetido nem a maus tratos nem a atos
cruéis. 2. Se for necessário matar um animal, ele deve de ser morto
instantaneamente, sem dor e de modo a não lhe provocar angústia.
Art. 4º - 1. Todo o animal pertencente a uma espécie selvagem tem o
direito de viver livre no seu próprio ambiente natural, terrestre, aéreo ou
aquático e tem o direito de se reproduzir. 2. toda a privação de liberdade,
mesmo que tenha fins educativos, é contrária a este direito.
Art. 5º - 1. Todo o animal pertencente a uma espécie que viva
tradicionalmente no meio ambiente do homem tem o direito de viver e de crescer
ao ritmo e nas condições de vida e de liberdade que são próprias da sua
espécie. 2. Toda a modificação deste ritmo ou destas condições que forem
impostas pelo homem com fins mercantis é contrária a este direito.
Art. 6º - 1. Todo o animal que o homem escolheu para seu companheiro tem
direito a uma duração de vida conforme a sua longevidade natural. 2. O abandono
de um animal é um ato cruel e degradante.
Art. 7º - Todo o animal de trabalho tem direito a uma limitação razoável
de duração e de intensidade de trabalho, a uma alimentação reparadora e ao
repouso.
Art. 8º - 1. A experimentação animal que implique sofrimento físico ou
psicológico é incompatível com os direitos do animal, quer se trate de uma
experiência médica, científica, comercial ou qualquer que seja a forma de
experimentação. 2. As técnicas de substituição devem de ser utilizadas e
desenvolvidas.
Art. 9º - Quando o animal é criado para alimentação, ele deve de ser
alimentado, alojado, transportado e morto sem que disso resulte para ele nem
ansiedade nem dor.
Art. 10º - 1. Nenhum animal deve de ser explorado para divertimento do
homem. 2. As exibições de animais e os espetáculos que utilizem animais são
incompatíveis com a dignidade do animal.
Art. 11º - Todo o ato que implique a morte de um animal sem necessidade é
um biocídio, isto é um crime contra a vida.
Art. 12º - 1. Todo o ato que implique a morte de um grande número de
animais selvagens é um genocídio, isto é, um crime contra a espécie. 2. A
poluição e a destruição do ambiente natural conduzem ao genocídio.
Art. 13º - 1. O animal morto deve de ser tratado com respeito. 2. As
cenas de violência de que os animais são vítimas devem de ser interditas no
cinema e na televisão, salvo se elas tiverem por fim demonstrar um atentado aos
direitos do animal.
Art. 14º - 1. Os organismos de proteção e de salvaguarda dos animais devem estar presentados a nível governamental. 2. Os direitos do animal devem ser defendidos pela lei como os direitos do homem.”
A Declaração de Cambridge é outro valioso documento, produzido por um grupo internacional de neurocientistas, neurofarmacologistas, neurofisiologistas, neuroanatomistas e neurocientistas computacionais cognitivos, que declararam:
“A ausência de um neocórtex não parece impedir que um organismo experimente estados afetivos. Evidências convergentes indicam que animais não humanos têm os substratos neuroanatômicos, neuroquímicos e neurofisiológicos de estados de consciência juntamente como a capacidade de exibir comportamentos intencionais. Consequentemente, o peso das evidências indica que os humanos não são os únicos a possuir os substratos neurológicos que geram a consciência. Animais não humanos, incluindo todos os mamíferos e as aves, e muitas outras criaturas, incluindo polvos, também possuem esses substratos neurológicos".
Em outras palavras a senciência
animal demonstra que os animais são seres conscientes e capazes de experimentar
sentimentos iguais aos dos humanos. Tal capacidade corrobora com a necessidade
de se defender a existência digna dos animais.
A Lei n.º 9.605/98 torna a conduta
de crueldade animal, um ato antijurídico, culpável e tipificado e dispõe sobre
as sanções penais e administrativas.
A forte pressão popular decorrente
do crime bárbaro cometido contra um cão chamado Sansão, resultou em 29 de setembro
de 2020, na Lei 14.064/20, mais conhecida como a Lei Sansão. Essa lei aumentou as
penas cominadas ao crime de maus-tratos aos animais quando se tratar de cão ou
gato, que será de reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, multa e proibição da
guarda.
Apesar de ser uma grande conquista
para o Direito Animal, ainda há o que se criticar, pois é uma lei especista,
uma vez que dá tratamento diferenciado aos animais. Afinal, não só os animais
domésticos experimentam o sofrimento, não é mesmo?
O Código de Direito e Bem-estar
animal do Estado da Paraíba, Lei Estadual n° 11.140/2018, merece grande destaque, pois foi a
primeira lei brasileira a catalogar expressamente os direitos fundamentais animais
para todos os animais vertebrados e invertebrados e não somente para cães e
gatos.
Aguarda-se novas proposições
legislativas animalistas para que se faça valer a Constituição do Brasil no que
se refere a proteção animal.
No próximo dia 26 de março, o STF decidirá se a Constituição do Brasil proíbe ou permite a prática cruel de alimentar a força, duas a três vezes por dia, patos e gansos, usando um cano inserido na garganta. Tal prática faz com que o fígado do animal inche e aumente em até 50% seu nível de gordura. Com o fígado hiperdesenvolvido é preparado um patê, mais conhecido como “foie gras”. Espera-se que o STF decida pela proibição do “foie gras”.
Do Grupo de Pesquisa em Direito
Animal: UNICURITIBA ANIMAL
O grupo de Pesquisa em Direito Animal do UNICURITIBA iniciou os seus trabalhos em meados de fevereiro de 2020. Tem encontros regulares com temas animalistas, com o objetivo de fomentar a produção de material científico para contribuir com a comunidade jurídica e dar maior visibilidade ao tema. Anualmente realizamos o Simpósio de Direito Animal, sempre no mês de outubro, quando comemoramos o dia internacional dos animais. Nesse ano faremos o III Simpósio de Direito Animal. Por fim, vale enfatizar que os integrantes do grupo de pesquisa são convidados a experimentar o ativismo animal seja pela judicialização do direito animal, pela elaboração de anteprojetos de lei animalistas, pelos resgates de animais em situação de rua para uma adoção responsável e apoio às famílias de baixa renda no cuidado com os seus familiares não humanos.
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