08/03/2021

Especial: Mulheres de Destaque - Ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber

 

Por Maria Letícia Cornassini e Rafaella Pacheco.

        Nesta data que é tão importante quanto todos os demais dias do ano, em que ser mulher extrapola as condições do corpo atingindo dimensões sociais e culturais por servir, como outrora já constatado por Rosa Luxemburgo e Silvia Federici, de alicerce às sociedades, é, portanto, correto afirmar que ser mulher possui também dimensões políticas. E cada vez mais é resgatado a história de mulheres que contribuíram e transformaram o meio em que viveram, pois estas deixaram reflexos significativos em nossa sociedade.
        Hoje, nossas vozes ressoam para além do âmbito doméstico, estamos cada vez mais conquistando espaços e cargos antes inacessíveis. Mas ainda é pouco e o horizonte desta estrada ainda é distante, a luta por igualdade não foi superada, a violência contra a mulher ainda é devastadora e com índices aterrorizantes de feminicídio. Por conta disso, faz-se necessário o destaque e exaltação de mulheres que ocuparam e ocupam postos relevantes de tomadas de decisão e, portanto, de transformação.
        Diante disso, traçamos o perfil de duas grandes mulheres do nosso sistema judiciário, as Ministras do Supremo Tribunal Federal Cármen Lúcia e Rosa Weber, que carregam em seus discursos e posicionamentos a defesa da igualdade de gênero exaltando a importância da presença e das vozes femininas no espaço público e privado.
    Mas, antes de tudo, é importante rememorar que a luta histórica por direitos femininos é concomitante à luta histórica por espaços no Direito. Não só a garantia de direitos básicos à vida civil foi difícil às mulheres, como também alcançar posições dentro do sistema que concedia estes direitos. Afinal, mulheres no Poder Judiciário significaria uma abertura de possibilidades a elas, abertura esta inviável em uma realidade que propaga(va) constantemente que a boa mulher seria a “Bela, recatada e do lar”.
        Por esta razão, é importante que conheçamos a trajetória de uma das mulheres responsáveis por fundar os alicerces que viabilizaram o ingresso de tantas outras mulheres no sistema judiciário.

Myrthes Gomes

        Myrthes Gomes foi a primeira mulher a ingressar na carreira jurídica, ainda em 1906. Antes dela, outras mulheres haviam frequentado faculdades de Direito, mas foi ela a primeira a receber a carteira da Ordem dos Advogados Brasileiros. A conquista, contudo, não veio fácil. Myrthes teve sua inscrição na Ordem cancelada e realizou diversos atos de militância até que seu pleito fosse aceito. Com uma trajetória permeada por lutas, a primeira advogada brasileira continuou sua carreira militando em causas em prol da extensão dos Direitos Civis às mulheres. Lutou pela legalização do divórcio, pelo fim da incapacidade civil da mulher casada e pela requisição do alistamento eleitoral. Lutou, de fato, por direitos básicos.

Ministra Cármen Lúcia

        Cármen Lúcia Antunes Rocha estudou Direito na Faculdade Mineira de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, com mestrado em Direito Constitucional na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais. Atuou como advogada, professora titular de Direito Constitucional na PUC-MG, foi membro da Comissão de Estudos Constitucionais do Conselho Federal da OAB, membro fundadora do Instituto de Defesa das Instituições Democráticas – IDID e atualmente é membro da Academia Internacional de Direito e Economia. Na magistratura atuou como Ministra do Supremo Tribunal Federal, Ministra Substituta do Tribunal Superior Eleitoral, e Diretora da Escola Judiciária Eleitoral do Tribunal Superior Eleitoral.
        Atualmente é Ministra do Supremo Tribunal Federal, sendo que de setembro de 2016 a setembro de 2018 foi a segunda mulher a ocupar a cadeira de Presidente do Supremo Tribunal Federal. A primeira mulher no Supremo a exercer tal função foi a Ministra Ellen Gracie de 2006 a 2008.
        Já em sua sabatina de ingresso ao STF, foi Dentro de sua atuação no Supremo Tribunal Federal, encabeçou diversas decisões de extrema significância para a jurisprudência nacional. Mais que isso, quebrou tradições e adentrou o plenário da Corte utilizando calças – coisa que até então não era permitido para mulheres-.
        A quebra de precedentes por parte da Ministra Cármen Lúcia acontece também nos votos exarados. Em 2012, em julgamento à ADI 4424 e à ADC 19, que dispunham sobre dispositivos da Lei Maria da Penha que estabeleciam tratamento diferenciado à mulheres nas questões relativas à violência doméstica, a Ministra proferiu voto em primeira pessoa e superou as ironias de seus colegas homens ao seu combate ao senso comum sexista. Votou “E isso que hoje se diz, ainda não sei se com certo eufemismo, com certo cuidado, deque nós somos mais vulneráveis, na verdade, significa que somos mulheres maltratadas, mulheres sofridas, todas nós que passamos por situações que, na generalidade, não deveríamos viver” e que “Estamos tentando ficar fortes, cada vez mais. E ações como essa, discussões como essa, nos permitem, exatamente, essa possibilidade”.

 Ministra Rosa Weber

        Rosa Maria Pires Weber formou-se em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, a magistrada iniciou sua carreira como Juíza do Trabalho substituta, na sequência como Juíza do Trabalho Presidente de Junta de Conciliação e Julgamento. Em seguida foi Juíza do TRT da 4ª Região – Desembargadora do Trabalho. Atuou também como Ministra do Tribunal Superior do Trabalho e do Tribunal Superior Eleitoral.
        Desde 19 de dezembro de 2011 é Ministra do Supremo Tribunal Federal e foi empossada como vice-presidente em 10 de setembro de 2020.
        Também, no mesmo julgamento da ADI 4424 e da ADC 19, de 2012, a Ministra Rosa Weber destacou que a Lei Maria da Penha “traduz a luta das mulheres por reconhecimento, constituindo marco histórico com peso efetivo, mas também com dimensão simbólica, e que não pode ser amesquinhada, ensombrecida, desfigurada, desconsiderada”, e chegando a afirmar que “em uma sociedade machista e patriarcal como a nossa, as relações de gênero, pelo desequilíbrio de poder, a concretização do princípio isonômico (art. 5o, I, da Lei Maior), nessa esfera – relações de gênero – reclama a adoção de ações e instrumentos afirmativos voltados, exatamente, à neutralização da situação de desequilíbrio”.

        Rosa e Cármen Lúcia são apenas 2 mulheres que conseguiram quebrar paradigmas e alcançar posições na mais alta Corte do Brasil. Não obstante, é importante destacar que o ingresso feminino nas Cortes Superiores ainda é muito restrito, em especial por conta da necessidade de indicação para alçar às cadeiras do poder. Uma rápida busca on-line para saber a composição de cada um das Cortes (STF, STJ, STM, TSE, TST) é suficiente para concluir que o percentual de mulheres em altos cargos judiciários não chega à índices de 30%.
        A infeliz realidade da pouca presença feminina em cargos majoritariamente políticos cumpre o papel de evidenciar como as crenças misóginas da sociedade ainda permeiam a realidade profissional das mulheres. Por esta razão faz-se tão necessário homenagear e destacar as mulheres que, apesar dos empecilhos intrínsecos ao meio, superaram barreiras e paradigmas e hoje servem de exemplo para que tantas outras possam crescer.



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