07/04/2020

Me indica um filme: O Julgamento de Nuremberg



Por Ricardo Passos e Karen Arçamenia*


Trate-se de um filme que remonta a história dos acontecimentos pós segunda guerra mundial, em que os países aliados formaram um tribunal militar internacional a fim de julgar, imparcialmente, 24 comandantes nazistas. Nuremberg foi a cidade alemã que contemplou o julgamento, e isso ocorreu em função dela ter se tornado, durante o período da ascensão nazista, a sede oficial dos Comícios do Partido Nazi - as reuniões de Nuremberg. Nesse cenário, os quatro países aliados formaram uma corte e garantiram o direito dos acusados à defesa. Certamente, os dirigentes nazistas tinham ciência de que seriam condenados, ainda assim articularam-se com o intuito de promover um debate que gerasse reflexão e, talvez, hesitação por parte da promotoria.


              Dos 24 indiciados, apenas 22 participaram, de fato, do julgamento, posto que um deles cometeu suicídio e o outro foi dispensado em virtude de sua saúde debilitada. As discussões, até então inéditas, abrangeram questões que envolviam direito e moralidade. O promotor-chefe, Robert H. Jackson, argumentou que a Alemanha havia promovido uma conspiração de ordem global, de modo que atrocidades como crimes de guerra e crimes contra a humanidade deviam ser consideradas pelos juízes. Essa argumentação, de certa forma, reacendeu o conceito de jusnaturalismo, uma vez que a ideia de moral, nesse caso, se associa necessariamente ao sistema jurídico. O direito à vida, por exemplo, devia ser reconsiderado dentro de um ordenamento, a fim da universalização de tal lei de cunho naturalista. 

No entanto, respaldado justamente na ideia do juspositivismo, a defesa argumentava que os dirigentes nazistas apenas cumpriam as normas que lhes eram atribuídas, isto é, o ordenamento jurídico era válido e tinha a aprovação da população alemã dentro de seu território. Hermann Göering, que dominava a retórica, se baseou na ideia de que a lei devia se impor. Eximiu-se da culpa agarrado nessa argumentação, como se a moral, que não estava imbuída na lei vigente, não tivesse importância nesse caso. Aqui vale ressaltar a máxima nullum crimen nulla poena sine lege, já que se deve, segundo essa defesa, garantir que exista uma lei previamente estabelecida para que se possa haver justiça no julgamento, e, como essa lei não existia, o que se seguiam eram as leis vigentes naquele contexto.


              Em face dessa argumentação, Jackson encontrou dificuldades em promover uma antítese. No entanto, foi amparado por uma enormidade de provas que acusavam e contradiziam os próprios comandantes nazistas. Ainda assim, com vistas ao conceito positivista, do direito objetivo, a tentativa de acusação culminou gerando um embate que contribuiu para o surgimento da corrente pós positivista, cuja finalidade consiste em imputar, novamente, valor moral ao direito, sem deixar de considerar a objetividade do sistema normativo. Pode-se concluir que essa corrente teve êxito, posto que o alto escalão nazista foi condenado pelos crimes cometidos.


              O filme apresenta a ideia do julgamento dos vencedores, de modo a provocar reflexões sobre questões inéditas, como a formação de órgãos internacionais. Por outro lado, uma vez que se foi instituído um tribunal de exceção (constituído à posteriori e exclusivamente para aquele fim), o próprio juízo natural que diz respeito aos direitos fundamentais de defesa, estavam sendo violados pela formação desse julgamento. Os réus não puderam escolher os advogados, já que os países aliados ditaram as regras de todo esse processo. 


              Fica ainda, nesse sentido, a impressão não muito bem definida acerca da legitimidade de um julgamento desse porte, ainda que, a qualquer olho humano, as imagens promovidas pelos nazistas tenham sido assustadoras. Reflete-se, em todo caso, sobre os direitos fundamentais dos acusados, do mesmo modo que estes renegaram os direitos fundamentais de suas vítimas. Contudo, a maioria dos comandantes foram condenados, alguns à morte, outros à prisão. Poucos foram absolvidos. E assim, como valor doutrinário, o filme registra o dilema em que se encontraram os envolvidos no tribunal de Nuremberg, no caso inédito em que se pretendeu revestir de legalidade um julgamento através de um sistema pós estabelecido, isto é, que não existia antes da guerra eclodir.

*Ricardo e Karen são alunos do Primeiro Período de Direito do UNICURITIBA. O filme "O Julgamento de Nuremberg" foi trabalhado em sala de aula pela Professora Michele Hastreiter, na disciplina de Teoria do Direito, com o intuito de discutir a superação do positivismo jurídico e a necessidade de resgatar os elementos axiológicos ao Direito. A professora solicitou aos alunos que elaborassem uma resenha crítica do filme. O texto de Ricardo e Karen foi eleito para postagem no Blog.


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