Maria da Glória
Colucci[1]
O trabalho esteve associado nos
primórdios das sociedades humanas ao sofrimento, dor e pesada carga a ser
suportada para sobrevivência individual e do grupo. As atividades braçais
predominavam, devido à necessidade de cultivo do solo e trato com os animais,
envolvendo, apenas, a força física para caçar e transportar os alimentos
produzidos.[2]
Com
o tempo, todavia, superadas as etapas mais longínquas do esforço individual no
trabalho e chegando-se à Idade Média, foram surgindo novas formas de labor, com
a divisão das tarefas entre “companheiros” e “aprendizes”, sob o comando dos
“mestres”, que remuneravam apenas os “companheiros”.
No
entanto, apesar da evolução na organização das atividades, os “mestres”,
proprietários das oficinas, podiam impor castigos corporais aos “aprendizes”
cujos pais pagavam taxas elevadas para que aprendessem o ofício ou profissão.[3]
Com
a Revolução Industrial (XVII) e o aparecimento de máquinas a vapor, o trabalho
tornou-se de um lado mais produtivo pela substituição do labor manual pela
máquina, mas, de outro ponto de vista, cruel, pelas condições desumanas e
insalubres. Assim, os trabalhadores ficavam expostos ao excessivo calor,
incêndios, explosões, intoxicações por gases etc, aceitando-se o trabalho de
crianças e jornadas de mais de 18 horas.
Na
verdade, a história do trabalho é marcada, ainda, pela exploração, indignidade
e desrespeito ao ser humano, haja vista, a denominada “escravidão moderna” (ao
redor do mundo).[4]
Com
as Declarações de Direitos, a exemplo da francesa (1789) e americana (1776),
foram sendo abolidas práticas mais cruéis, mas ainda persistentes em muitas
regiões do mundo.
Novos
horizontes se abriram ao combate ao trabalho escravo, com a criação da
Organização Internacional do Trabalho (1919), “que iria incumbir-se de proteger
as relações entre empregados e empregadores no âmbito internacional, expedindo
convenções e recomendações nesse sentido.[5]
No
Brasil, com a Constituição de 1934 e mais tarde, com a Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT), em 1943, as relações contratuais de trabalho receberam fôlego,
dando-se à atividade laboral mais valorização.[6]
Com
a Constituição de 1988, nos arts. 7º a 11, o trabalho adquiriu status de direito social, cuja natureza
prestacional (dever do Estado) impõe limites intransponíveis à dignidade da
pessoa humana.[7]
Ao
ver de José Cláudio Monteiro de Brito Filho, o trabalho decente requer condições
adequadas ao exercício desta importante atividade humana, podendo ser assim
conceituado:
Trabalho decente, então, é um
conjunto mínimo de direitos do trabalhador que corresponde: ao direito ao
trabalho; à liberdade de trabalho; à igualdade no trabalho; ao trabalho com
condições justas, incluindo a remuneração, e que preservem sua saúde e
segurança; a proibição do trabalho infantil; à liberdade sindical; e à proteção
contra os riscos sociais.[8]
Assim,
o trabalho decente deve ser entendido como a atividade humana que cumpre com as
formalidades legais para seu exercício, respeitados os direitos e princípios
constitucionalmente garantidos e internacionalmente adotados, em Documentos da
OIT – Organização Internacional do Trabalho.[9]
O
trabalho evoluiu de uma concepção escravizante, humilhante e até mesmo
degradante da pessoa do trabalhador, para ser transformado, em decorrência de
novos valores, em autorealização, em instrumento de ascensão social, pelo status alcançado, pelo empoderamento
decorrente do enriquecimento ou do reconhecimento profissional.
Pode-se
afirmar que o “trabalho decente” tem por finalidade principal propiciar ao
empregado o bem-estar individual (satisfação, felicidade), ao mesmo tempo que
lhe permite atender às suas necessidades e de sua família com dignidade (art.
7º, IV, CF).[10]
Por
tantos motivos, além dos citados, foi que a Agenda 2030 (ONU) incluiu dentre
seus Objetivos (ODS), o de nº. 8: “Promover o crescimento econômico sustentado,
inclusivo e sustentável, emprego pleno e produtivo e trabalho decente para
todos”.[11]
[1]
Advogada. Especialista em Filosofia do Direito (PUC-Pr). Mestre em Direito
Público (UFPR). Professora aposentada da UFPr. Professora titular de Teoria do Direito
(UNICURITIBA). Orientadora do Grupo de Pesquisas em Biodireito e Bioética – Jus
Vitae. Membro do Instituto dos Advogados do Paraná (IAP). Membro da Sociedade
Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Membro da Comissão do Pacto
Global (OAB-Pr). Membro da Associação Brasileira de Mulheres de Carreira
Jurídica (ABMCJ-Pr). Membro do Movimento Nacional ODS (ONU, Pr). Membro da
Academia Virtual Internacional de Poesia, Arte e Filosofia- AVIPAF. Membro do
Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos do UNICURITIBA. Escritora e
poetisa, com vários prêmios em textos jurídicos e poéticos.
[2] MARCONI, Marina de
Andrade./Zélia Maria Neves Presotto. Antropologia: uma introdução. 6º ed. São
Paulo: Atlas, 2005, p.118-120.
[3] MARTINS, Sérgio Pinto.
Direito do trabalho. 14 ed. São Paulo: Atlas, 2001, p.34.
[4] Escravidão moderna atinge
mais de 40 milhões no mundo. Disponível em www.noticias.uol.com.br
[5] MARTINS, Sérgio Pinto.
Op.cit; p.38.
[6] BRASIL. Consolidação das
Leis do Trabalho. Decreto-Lei n.5452, de 1º de maio de 1943. Disponível em
www.planalto.gov.br
[7] BRASIL. Constituição da
República Federativa do. 1988. Disponível em www.planalto.gov.br
[8] BRITO FILHO, José Claudio
Monteiro de. Trabalho decente: análise jurídica da exploração do trabalho: trabalho
escravo e outras formas de trabalho indigno. 4 ed. São Paulo: Ltr, 2016, p.56.
[9] OIT. Organização
Internacional do Trabalho. Disponível em www.nacoesunidas.org
[10] BRASIL. Constituição da
República Federativa do. 1988. Disponível em www.planalto.gov.br
[11] ONU. Transformando Nosso
Mundo: Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Disponível em
www.nacoesunidas.org