04/08/2019

Agenda 2030: SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL (ODS 2)

Maria da Glória Colucci[1]


          A carência alimentar e nutricional representa um complexo problema econômico e social, cujo enfrentamento exige soluções imediatas das autoridades governamentais e da sociedade.
          Aparentemente, os obesos estão superalimentados, mas é comum apresentarem deficiências nutricionais, pelo consumo desordenado de alimentos processados, sem as necessárias proteínas e vitaminas essenciais ao equilíbrio biopsíquico do indivíduo. A desnutrição causa uma série de reflexos no desempenho físico e intelectual da pessoa, na vida secular e no trabalho.[2]
          Políticas emergenciais podem, às vezes, suprir o problema localizado da fome, em regiões empobrecidas ou devastadas por intempéries ou desastres climáticos; no entanto, apenas respostas estruturais podem enfrentar técnica e socialmente o problema da fome. Investimentos em agricultura sustentável e capacitação de mão de obra especializada em produção de alimentos hortifrutigranjeiros podem mudar o cenário da fome no mundo e, em particular, no País.[3]
          A fome é um fenômeno comum, sobretudo, aos países do chamado “mundo subdesenvolvido”, onde a baixa renda, a baixa escolaridade e a falta de acesso a alimentos nutritivos geram uma legião de “famintos crônicos”, que vivem à margem de qualquer condição social digna. A fome desestabiliza o indivíduo, sua família e o grupo social do qual participa, afetando-os física e moralmente, incapacitando-os para o trabalho, as relações sociais e a vida familiar.
          A fome, acompanhada da miséria, corrói os horizontes futuros do cidadão, retirando-lhe perspectivas profissionais e, a longo prazo, prejudica seu desenvolvimento físico e intelectual:

[...] a omissão dos poderes públicos frente à realidade da fome, significa não apenas a violação a um direito social, implica, sobretudo, na violação ao princípio da igualdade e da dignidade da pessoa humana, uma vez que retira a sua capacidade primária de enxergar-se um cidadão.[4]

          Hábitos alimentares direcionados para a promoção da saúde dependem de políticas públicas educacionais, cujas orientações, sobretudo às populações menos esclarecidas, precisam ser implementadas continuamente.
          Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ONU, Agenda 2030), ressaltam, em dois momentos distintos (ODS 1), o intuito de “acabar com a pobreza” e “acabar com a fome “(ODS 2). Há interconexão do indisfarçável binômio fome-pobreza, conforme se verifica na Agenda Global.[5]
          O “mínimo existencial”, nas suas leituras e releituras doutrinárias, no tocante à alimentação, se diferencia conforme o padrão socioeconômico de cada sociedade, no entanto, não se pode ignorar que corresponde ao suprimento das necessidades vitais básicas, dentre as quais se inclui a alimentação conforme o Texto Constitucional vigente (art. 7º, IV).[6]
          Como suporte da vida, da saúde e do trabalho, a alimentação adequada promove a sobrevivência digna e representa o arcabouço dos direitos fundamentais, em sua plenitude individual e coletiva: não há vida e saúde sem alimentos em quantidade e qualidade necessárias à subsistência humana de forma universal e igualitária.
          A segurança alimentar e nutricional tem na Lei 11.346/06 a base, as diretrizes, estruturas e demais instrumentos asseguradores do direito humano à alimentação adequada.[7]
          Ao criar o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – SISAN, o legislador procurou regulamentar, minimamente, o direito à alimentação, com a participação da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e de entidades privadas (art. 7º, da Lei 11.346/06).[8]
          Dentre os alimentos essenciais, à qualidade de vida, encontra-se a água potável em quantidade e qualidade suficientes, dependente, por sua vez, do saneamento básico.[9]
          No Brasil, a Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN) deixa à evidência o caráter intersetorial, no que respeita à produção e ao consumo de alimentos, no tocante aos fatores culturais que interferem em sua seleção pelos consumidores, considerando-se as práticas e hábitos alimentares regionais.[10]
          O desenvolvimento cognitivo, sobretudo de crianças e adolescentes é fortemente comprometido pela fome, conforme análise de Flávio Luiz Schieck Valente.[11]
          A miséria e a fome andam, infelizmente, de mãos dadas, retratando as desigualdades sociais, que separem os cidadãos brasileiros em dois grupos: “os que comem” e os que “passam fome”.


[1] Advogada. Especialista em Filosofia do Direito (PUC-Pr). Mestre em Direito Público (UFPR). Professora aposentada da UFPr. Professora titular de Teoria do Direito (UNICURITIBA). Membro do Instituto dos Advogados do Paraná (IAP). Membro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Membro da Comissão do Pacto Global (OAB-Pr). Membro da Associação Brasileira de Mulheres de Carreira Jurídica (ABMCJ-Pr). Membro do Movimento Nacional ODS (ONU, Pr). Membro da Academia Virtual Internacional de Poesia, Arte e Filosofia- AVIPAF. Membro do Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos do UNICURITIBA. Escritora e poetisa, com vários prêmios em textos jurídicos e poéticos.
[2] ABREU, Ana Kapin, Gabriela. Socorro! meu filho come mal. Rio de Janeiro: Leya, 2014.
[3] COLUCCI, Maria da Gloria. Soberania alimentar. Disponível em rubicandarascolucci.blogspot.com
[4] BISPO, Vanesca Freitas. Direito fundamental à alimentação adequada: a efetividade do direito pelo mínimo existencial e a reserva do possível. Curitiba: Juruá, 2014, p.61.
[5] ONU. Transformando Nosso Mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Disponível em www.sustainabledevelopment.un.org
[6] BRASIL. Constituição da República Federativa do.1988. Disponível em www.planalto.gov.br
[7] BRASIL. Lei 11.346/06, 11 de setembro de 2006. Cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – SISAN. Disponível em www. planalto.gov.br
[8] BRASIL. Lei 11.346/06, 11 de setembro de 2006. Cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – SISAN. Disponível em www. planalto.gov.br
[9] COLUCCI, Maria da Glória. Sede: fome de água. Disponível em rubicandarascolucci.blogspot.com
[10] BRASIL. PNAM – Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Disponível em www.bvsms.saude.gov.br
[11] VALENTE, Flavio Luiz Schieck. Direito humano à alimentação: desafios e conquistas (org). São Paulo: Cortez, 2002, p.30-32

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