A
Ciência Política é uma das matérias basilares à formação dos juristas, que possui
o Estado como objeto de seu estudo, e traça íntimo diálogo com o Direito Constitucional.
E, neste ponto, que iniciaremos a nossa sugestão de leitura para o início deste
segundo semestre letivo. Como as
Democracias Morrem[1]
foi um livro escrito por dois professores/pesquisadores de Ciência Política de
Harvard, Steven Levitsky e Daniel Ziblatt. O primeiro possui o enfoque de sua
pesquisa na América Latina, e Ziblatt na Europa do século XIX até os dias
atuais.
A
obra teve sua primeira edição publicada no Brasil em ano eleitoral, em 2018, e
é considerada um best-seller devido sua linguagem acessível, qualidade e
recorte da pesquisa, sendo o tema extremamente relevante devido os contextos subversivos
à democracia que ressurgem de forma sutil na política, em escala global. Em
nove capítulos, nos é apresentado pelos professores Levitsky e Ziblatt o que o The New York Times classificou de guia
lúcido e essencial sobre como as democracias podem entrar em colapso seja o
lugar que for.
O
livro foi escrito com a intenção de se responder a pergunta: “democracias
tradicionais entram em colapso?”. E, tal questão, advém do fato da democracia
norte americana ser uma das mais consolidadas e referenciadas democracias do
mundo, mas que, atualmente tem gerado uma crescente incerteza a respeito da
segurança de seu sistema democrático de direito devido ao seu cenário político,
desde a eleição de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos. Para isso,
Levitsky e Ziblatt comparam a situação política atual norte americana com uma
análise histórica de contextos de regimes totalitários ocorridos no mundo.
Neste ponto, o olhar sobre tais conjunturas ocorridas na América Latina, bem
como o contexto e análise sobre a democracia nos Estados Unidos é enriquecedor.
Servindo-nos como um alerta, principalmente à nós brasileiros, em relação ao
nosso cenário político atual que tem buscado, por parte de nossos
representantes eleitos, um espelhamento e sujeição equivocada aos
posicionamentos e estratégias do presidente norte-americano (em termos de
políticas sociais, ambientais e militares).
Os
autores demonstram, através de suas pesquisas, como a ruína da democracia pode
se dar de diversas formas. O que antigamente se configurava numa morte abrupta
e trágica — como ocorrido no Chile, em que a morte da democracia foi marcada
com a morte do presidente eleito Allende, pelas forças armadas chilenas — pode
também ocorrer de maneira gradual, sutil e legal, através de líderes eleitos,
os chamados outsiders políticos.
“O
retrocesso democrático hoje começa nas urnas.”[2]
Além
do diagnóstico minucioso de como processos antidemocráticos se instauram no
poder através do próprio sistema democrático afim de dissolvê-lo, há alguns
pontos importantes da obra que gostaríamos de ressaltar. O primeiro, é o papel
do Poder Legislativo e do Poder Judiciário que, nesses cenários de subversão da
democracia, atuam como aliados do Poder Executivo, aprovando e aceitando seus
atos. Mantendo, através de uma legitimidade legal própria da segurança
jurídica, o que Levitsky e Ziblatt denominaram de um “verniz de democracia” enquanto o sistema, em sua essência é
corroído.
Em segundo, a maneira como
aspirantes a autocratas justificam medidas antidemocráticas através de
situações de crise como instabilidade econômica, perigo à segurança nacional,
ou mesmo desastres naturais. Desta forma, o verniz se mantém, conseguindo a
tolerância e, por vezes, o apoio da população em tais decisões.
Outro ponto, refere-se ao papel
fundamental de partidos já estabelecidos em salvaguardar a democracia, distanciando-se,
isolando e derrotando forças extremistas que pretendem ascender ao poder. Para
isso, é essencial que tais partidos tenham clareza sobre o perfil,
posicionamento e discurso de seus candidatos, bem como, tenham a defesa do
sistema democrático e do bem do país acima de qualquer divergência política e
ideológica.
A
obra Como as Democracias Morrem é
densa em seu conteúdo, e merece um olhar atento dos acadêmicos de Direito. É um
livro fundamental pois, visando responder às incertezas políticas de nosso
tempo, perpassa os fundadores do presidencialismo norte americano — desde o
início preocupados com salvaguarda da democracia —, os caminhos trilhados pelo
autoritarismo na América Latina e na Europa, e o papel das Constituições que,
de acordo aos autores, possuem ao menos quatro defensores: as instituições críticas,
os partidos políticos, os cidadãos organizados e as normas democráticas.
Boa leitura!
[1]
LEVITSKY, Steven; ZIBLATT, Daniel. Como
as Democracias Morrem. Tradução: Renato Aguiar. 1 ed. Rio de Janeiro:
Zahar, 2018.
[2]
LEVITSKY; ZIBLATT, 2018, p. 16.
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